sábado, 23 de janeiro de 2010

Perder


Ponderei que tudo o que temos neste mundo vem das coisas que perdemos.
Perdemos as ilusões a ponto de nos tornarmos humanos e sonhamos até perdermos a vida.
Perdemos oportunidades e lançamos dados sobre a mesa, dispostos a perder a dignidade.
Perdemos o medo e o pudor. Damos o corpo e a vida. Amamos e perdemos o medo de caminhar de mãos dadas pelas ruas.
Aprendemos a ripostar e perdemos amigos, perdemos lutas, perdemos o equilíbrio. E temos nas mãos um amor tão instável que se perde em nós, no medo de o virmos a perder.
Perdemos a noção das horas enquanto nos perdemos uns nos outros. Ou em conversas perdidas em emaranhados labirínticos de emoções.
Perdemos empregos. Perdemos amantes. Perdemos amores. Perdemos a vida. Perdemos a alegria de acordar de manhã e perdemos as lágrimas.
Perdemos o mundo. Perdemos o corpo. Perdemos a alma e perdemos a fé.
A ironia é que perdemos algo todos os dias da nossa vida - perdemos tudo até não restar mais do que poeira - e usamos o mesmo verbo que usaríamos para dizer que não sabemos onde estão as chaves de casa...

Marina Ferraz

quinta-feira, 7 de janeiro de 2010

Palavras


“Eu amo-te, não só pelo que és, mas pelo que eu sou quando estou ao teu lado.” Roy Croft

Falei. E em todas as palavras que disse, encontrei o mesmo vazio sem sabor. O mesmo desejo incoerente de que a tua voz se cruzasse com a minha ou a de que os teus lábios me silenciassem.
Imaginei, por um segundo, que me envolvias no calor de um abraço e que me sussurravas ao ouvido palavras proibidas pelo tempo e pela vida. E eu sorria. Inocente, incoerente… sorria porque eu saberia, com toda a certeza, que tinhas razão. Dissesses o que dissesses. Terias sempre razão.
Os teus olhos de sol viriam iluminar a minha vida e, a seu tempo, sei que aprenderia a viver longe das trevas. Nas palavras. Na luz. Nas tuas palavras e na tua luz.
Falei. Tinha esperança de que pudéssemos construir um castelo sobre as nuvens e reinar sobre uma imensidão de estrelas rebeldes. Ou talvez pudéssemos simplesmente deitar-nos acima do nevoeiro e olhar para o céu estrelado como se fosse a maior maravilha do mundo.
Palavras. Palavras que não ouviste. Mas o que importa? Descobri que amo cada traço teu, mesmo quando não ouves os meus desejos. Há uma beleza inexplicável no teu rosto de marfim quando estás comigo e o teu pensamento não está. Imagino que também estás a sonhar. A sonhar, talvez, com todas as palavras que me disseste e com todas as que me dirás um dia, se o mundo não nos separar para sempre.
Falei. E a resposta que ecoou pelo céu dos meus desejos foi somente o silêncio. Mas, ainda assim, os meus lábios curvaram-se num sorriso ténue. Amo tudo em ti. Até a pessoa que me fazes ser. Esta pessoa que ama a tua presença e se satisfaz com as estrelas. Esta pessoa que, para estar bem, só precisa de saber que existes. Esta pessoa que sabe que um dia não vais estar mas que acredita que, contigo, poderia ser muito mais feliz.

Marina Ferraz
*imagem retirada da Internet