terça-feira, 2 de abril de 2024

Caridade

 


Não quero saber se temos o mesmo sangue. Ou se somos amigos de longa data. Ou conhecidos. Ou fruto de um flirt qualquer. Não quero saber se dormimos juntos. Amantes de noites ocasionais. Ou amantes de noites regulares. Ou cama sem a dignidade que cabe na palavra amante.

 

Não quero saber quem tu és… Não faças o favor de me amar!

 

Eu nunca precisei que me amassem por caridade e dispenso a compra e venda de favores emocionais.

 

Se queres salvar a alma, sai à rua e alimenta quem tem fome. Vai dar o teu tempo aos idosos nos lares. Mudar a fralda de órfãos e crianças retiradas às famílias, por falta de amor ou dinheiro. Envia as roupas que despiste ou que te despiram para os países de terceiro mundo. Não deites lixo para o chão. Evita o plástico. Recicla. Toma banhos mais curtos. Desliga a torneira enquanto lavas os dentes. Come menos carne. Amarra-te às árvores que vão ser abatidas. Assume-te contra a guerra. Qualquer guerra. A guerra de um. A guerra do outro. Sê pacifista. Objetor de consciência. Vai às manifestações. A todas! As climáticas e as que fazem mau clima para quem está no poder. Vota. Mas vota a pensar nos outros e não no teu umbigo. Planta árvores. Não arranques flores. Vai com baldes de água apagar incêndios. Dá lume a quem quer fumar uma ganza e se esqueceu do isqueiro. Mantém a porta aberta para a pessoa atrás de ti entrar ou sair. Vai a pé ou de bicicleta. Dá conferências, palestras, workshops e Ted Talks sobre a bondade e a empatia. Começa grupos temáticos de apoio às vítimas de abuso, de agressão, de luto, de vício ou de trauma. Faz caridade com o mundo, que bem precisa. Eu dispenso.

 

Eu nunca precisei que me amassem por caridade! Por isso, se estás a tentar fazer à alma o que os suinocultures fazem aos porcos, não faças. Eu não sirvo de lavagem, para nutrir o ego de ninguém. Estou muito cansada de cobrança. Estou muito cansada de opiniões. Estou muito cansada de favores e favorzinhos que nunca pedi, cobrados por dá-cá-aquela-palha. Não sou lavagem nem burro para gostar de palha. Não faças o favor de me amar.

 

Mas, por favor, reserva a energia que te tomaria esse favor. Esse esforço. Esse. De me amares. De fingires que amas. Reserva-a e vai fazer algo que valha a pena.

 

O mundo está muito mais necessitado de amor do que eu estou. Porque eu me amo. Muitíssimo. E, mesmo que não faça tudo o que mundo precisa, tento. Tento dar esse amor imenso que me chega e sobra, espalhando-o um pouco por toda a parte.

 

Tenho a alma lavada de bênçãos e dispenso caridade.

 

E o único favor que peço é que, se um dia eu quiser esse tipo de afeição, se um dia o pedir, me matem. Será, certamente, porque esgotei o amor que tenho para dar. E o meu papel na Terra estará, então, cumprido.


  Marina Ferraz




Fiquem atentos ao meu Instagram para saberem todas as novidades em primeira mão!




Se quiserem adquirir o meu novo livro "[A(MOR]TE)"

enviem o vosso pedido para marinaferraz.oficial@gmail.com

 





 

1 comentário: