terça-feira, 2 de junho de 2020

Caem




Caem. Caem ao chão e desaparecem. É como se nunca tivessem existido. Não adianta fazer vénias à vida, dobrando costas para aproximar os olhos míopes do chão, nem andar de joelhos, procurando debaixo dos móveis com laivos de esperança. Caem. E, quando caem, desaparecem. Para sempre.

Claro que ninguém aceita. Quando caem, lá ficamos, de rabo para o ar e cabeça encostada junto ao solo, orelha com raiz da vida, tentando descobrir o misterioso fenómeno do desaparecimento. Um Poirot entre os meus neurónios engendra teorias sobre o estranho caso e faz uma lista de notas sobre todos os potenciais buraquinhos e reentrâncias que possam albergá-los, camuflá-los ou encobri-los. Mas até esse neurónio, que viu demasiados policiais, acaba por desistir e voltar às sinapses normais, com um suspiro.

Fico a imaginar se, algures, existe uma mão estendida noutro plano para os apanhar. Quando caem. Para os levar para essa outra dimensão, onde servem para segurar alfinetes de peito e vivências.

Mas caem. Com frequência e demasiadas vezes. Quando caem, desaparecem de todo o lado, menos da memória concreta de dois olhos que viram cair e não sabem explicar como nem para onde.

Caem. Caem no chão e desaparecem. Por vezes, ainda se ouve o som agudo e metálico quando atingem o solo. Mas é como se o furassem. Não encontramos mais. E, aos poucos, toda a utilidade que tinham começa a transformar-se num caos feito de escassez. Como se nunca desse para fechar o que, tão evidentemente, não foi feito para ficar aberto.

Resta a desistência ou a busca pelo novo. Porque, quando caem, paz à sua alma. Dali, mais nada virá!

Sentada no chão, ainda deixo os olhos procurarem um pouco mais, sem sucesso. Suspiro outra vez. Resmungo. Quando caem não aparecem mais!

Eu sei… era só a parte detrás de um brinco.

Mas também vale para as oportunidades.




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