Quero gravar permanentemente na minha pele esse conceito. Quero injetá-lo nos poros, agarrá-lo com a força férrea da agulha e com a inexorável robustez da definição. Trazê-lo visível em mim. Não dona, mas portadora e espelho de toda a vastidão de significado. Trazer nessa palavra o mundo inteiro. Levar o mundo inteiro até aos olhos fugidios das gentes. Dizer-lhes que bebam da bênção, enquanto há bênção. Que lutem por ela, quando a não houver.
Houve muitos anos que foram um dia muito breve, e gente como nós celebrou a palavra. O conceito. Agarraram cravos como se fossem glória. Disseram “nunca mais”, qual criança que acredita na magia e jura, pés reunidos e cabeça na lua. Prometeram que depositariam nas mãos dos filhos a palavra. Para que os netos a herdassem. E depois os bisnetos. E assim sucessivamente, até que o “para sempre” se fizesse. Mas, da tirania, os filhos pouco se lembravam, os netos nada... e os bisnetos viram os pais cuspir no prato em que comiam, fervendo em fogo lento o despotismo de antigamente. Receita amarga, essa. Feita de muita saliva gasta em vão, com as ervas tóxicas do jardim dos abonados, fervido nos fornos nucleares da violência e mexido com a madeira suave de um lápis.
O caldo é azul e vermelho. O primeiro traçado. O segundo derramado. Tons que se reúnem no mesmo rio tirano. Tantos bebem dele. Tantos nadam nele. Tantos se afogam nele. Estou à margem. Foi assim que vivi a vida, e assim permaneço. À margem. Na margem. Odiando o ódio. Odiando quem me faz saber o que o ódio é, obrigando-me a senti-lo, porque não o sentir seria ofender os meus avós e todos os que, como eles, lutaram.
Quero gravar permanentemente na minha pele esse conceito. Com tinta, cravo o cravo em mim. Identifico-me como soldado na luta ingrata de uma minoria – será?!? – que ainda acredita. Sou a criança de pés reunidos e cabeça na lua. De cabeça na lua e corpo na luta.
Dizem que não se deve tatuar o nome do amor da nossa vida no corpo. Que pode não ser para sempre... eu sei. Sei que pode não ser para sempre. Desconfio que não será. Mas quero gravá-lo na pele por isso mesmo. Porque, mesmo acabando, assim o trarei na pele até ao último suspiro, escrito pela minha própria mão. E, depois da expiração final, depois de reduzida a fogo, poeira e nada... terei a eternidade para o viver. Entre as árvores e a ribeira, com os pássaros e as borboletas e os vermes. Até lá, quero ter no corpo o nome desse amor. Esse conceito herdado. A Liberdade.
Perguntam: E depois? Da tatuagem? Nada... Do conceito? Bem... não tenho filhos. Que o meu herdeiro seja o mundo!
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