Vocês podem ouvir a manhã nascer no cantar de um galo, a
maré subir no grito da gaivota, a eternidade cantada na voz do vento. Podem
ouvir o soar de um suspiro, o bramir de um sino ao longe, o correr do rio
inquieto para o mar. São coisas nas quais não reparam, é claro. Foi-vos dado à
partida. Não lhe dão valor.
Eu não ouço essas coisas. Não poderia ouvi-las ainda que
orasse todas as noites por um milagre. Mas não tenham pena de mim. Não me
lancem sorrisos de piedade. Não preciso deles.
As palavras são a minha música. É a ler que junto as silabas
como notas e as deixo tocar dentro de mim uma canção que nem todos podem ouvir.
Mas eu posso ouvir esta canção eterna porque a ouço, não com os ouvidos mas com
a alma e o coração.
Eu ouço um sorriso. De olhar para ele, sei dizer, sem medos,
que é feito nos tons de uma balada que eu não posso ouvir. E cada sorriso soa
diferente no meu coração. Cada sorriso é tocado no seu tom e recebido na minha
alma com uma sonoridade diferente.
Eu ouço o beijo na face. O tom ternurento e meigo de um
abraço entre dois amigos. O olhar trocado entre amantes que se escondem nas
esquinas. Eu ouço o desassossego. A lágrima que rola pela face e segue, segue,
até cair nas mãos abertas. Eu ouço o ciúme, a tristeza, a alegria. Eu ouço o amor,
o carinho, a saudade. Eu ouço as sereias que vagueiam nas profundezas do
oceano. Sim, eu ouço tudo isso com a alma, com o coração, com os ouvidos do
sentir.
Nunca ouvirei o mesmo que vocês, nem da mesma forma. Aos
meus ouvidos não foi dada a dádiva de poder conhecer o mundano que tantos
escutam e ignoram. Mas, em retorno, deram-me um coração gigante, capaz de
sentir tanto que eu jamais poderia ignorar o som dos sentimentos, dos gestos,
dos desejos.
Ser surdo não é não ouvir o que se ouve. É ignorar o toque
do mundo em silabas de promessa e eternidade. É ignorar os sentidos. Eu não
ouço. Mas não sou surda. Sei retirar música das coisas que vejo, das coisas que
toco, de tudo o que sinto. E a minha vida avança com a mais bonita das bandas
sonoras. Porque eu ouço o inaudível. E é nessa canção de alma que se conhecem os
sons mais bonitos do mundo.
Marina Ferraz
*Imagem retirada da Internet
Ameeeeiii o seu texto... Tocou muito no meu coração e na minha alma.
ResponderEliminarPois, as suas palavras verdadeiras abalaram se o meu coração...
Realmente não ouço, apenas sinto e vejo os "sons" o que se passa nossa volta...
Sinto me grande no interior, não sei expressar o que sinto mais mas você que entende o que estou a dizer...
Tens muito jeito, Marina, continuaaa, força! ;)
Beijinho da tua fã Paty
Ah Marina,tão lindo teu texto,me deixou emocionada,parabéns,tudo que fazes é perfeito,sou tua eterna fã.
ResponderEliminarBeijinhos Jenny ♥ ♥
e surpriendente a profundidade do texto a cada palavra de sentimento profundo ...ao delinear da exposiçao de tao grande sencibilidade.e é mais um trabalho que emriqueçe seus dons literarios.
ResponderEliminarParabéns,ótimo texto adoro o vosso jeito de escrever,tão profundo,me toca muito.
ResponderEliminarBeijos
Este texto está diferente daquilo que costumas escrever. Está óptimo!!! Gostei! :D
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