terça-feira, 27 de agosto de 2013

Banda sonora


Fazes parte da banda sonora da minha vida. A cada passo dado, sinto-te tocar os acordes da minha felicidade, numa busca pelo que fica dentro das melodias do amor.
Tocas-me com facilidade as cordas gastas da alma, como se soubesses de cor como travar o desafino constante das mágoas que me assombram e fazer soar apenas o que é belo em mim. Mas dás-me pelos defeitos e sorris-lhes. Fazes dos meus sons um caminho sem silêncios. Seguras-me a insegurança, sem sequer te aperceberes e matas-me a ansiedade com uma nota solta de alegria.
Fazes parte da banda sonora da minha vida. Tocas em mim. Tocas para mim. Tocas-me a mim. E, subitamente, é como se tudo fosse música, como se tudo encaixasse, peça a peça, e se eternizasse, aos poucos, numa balada de sentimentos e de sentidos.
E a música vai tocando. À medida que o tempo passa e a mágoa desvanece, abrindo espaço a um sem fim de emoções sadias, que se espelham em mil memórias inventadas sobre o que está para vir.
A música vai tocando: leve e certa, completa, suave, perfeita. Tem som, tem letra, tem voz. Todas elas unidas pela concordância sentida da dualidade das almas que se completam e se confortam.
Tem o tom da felicidade e do sonho. Tem o tom do que fica escondido sob as coisas que nem todos conseguem ouvir. Mas nós conseguimos: tu e eu. E, por conseguirmos ouvi-la,  sorrimos na distância incoerente, ao som de uma mesma canção, cheia de promessas de eternidade.
Fazes parte da banda sonora da minha vida. Como se todas as músicas do meu passado dolorido tivessem tocado penas e amarguras apenas para que, depois, tocasses tu. E foi em crescendo que me vi chegar a ti, sem saber que, na minha vida, podia ainda tocar algo tão belo.
Sim. A música vai tocando. O seu som inunda-me a sala, a casa, a alma... e deixa-me esquecer que alguma vez tive outra canção além da tua. Soas a esperança e a felicidade. Soas a destino e eternidade. E a música vai tocando em mim. Faz-me dançar. Sorrir. Faz-me sentir que nenhuma outra música me mereceu os passos e as coreografias. Faz-me sentir que nenhuma outra canção me mereceu as lágrimas - alegres ou tristes.
Fazes parte da banda sonora da minha vida. Cantas-me. Tocas-me. Conheces-me e entendes-me. E a minha alma gosta de ver as suas cordas serem tocadas pelos dedos insensatos das tuas palavras, dos teus planos, dos teus desejos.
É uma música perfeita. Uma música que só tu sabes tocar e só eu sei ouvir. Porque é nossa... e de mais ninguém!

Marina Ferraz
*Imagem retirada da Internet

segunda-feira, 19 de agosto de 2013

O mago


Vem comigo ver o mago. Chegou ontem à cidade e todos falam dele. Dizem que transformou terra em pedra. Dizem que transformou a rocha sólida em flor. Na flor mais suave, na flor mais linda. Dizem que olhou para o céu e transformou as nuvens em pó e o pó em estrelas.
Vem comigo ver o mago. Dizem, pelas ruas, que ele transformou muros em estradas e das estradas fez caminhos que davam para ir a qualquer parte do mundo.
Dizem que tocou no chapéu de um mendigo que pedia esmola e o transformou na mansão mais imponente, que sorriu a um seixo e ele se fez borboleta e voou, cada vez mais alto, mudando de cor, mudando de forma, até se tornar ave.
Vem comigo ver o mago. Ele passou pelas ruas da cidade e transformou lágrimas em sorrisos, saudade em harmonia, violência em dança.
Passou pelas ruas e transformou casebres em castelos, velhas em meninas, sementes em árvores com flores e frutos.
Anda. Vem comigo. Vamos ver o mago. Vamos vê-lo transformar a morte em vida, a dor em sossego, a podridão em arte. Vamos segui-lo em silêncio pelas ruas cinzentas e ver o cinzento ganhar cor a cada toque, a cada olhar.
Vem comigo ver o mago. Anda. Não percamos tempo! Quem sabe se ele não transforma o teu silêncio em palavras e a tua indiferença em amor.

Marina Ferraz
*Imagem retirada da Internet

quarta-feira, 14 de agosto de 2013

A lista


Um dia vamos andar de mãos dadas pela rua. De dedos enlaçados num abraço apertado que se estende além dos olhares de quem passa. Não deveremos explicações a ninguém. Por isso, deixaremos que olhem, mesmo sabendo que, olhando para as nossas mãos, não nos compreendem a alma, também enlaçada em abraços e sentidos.
Iremos ver o mar. Sorrir aos pores do sol. Olhar dentro dos olhos um do outro, ignorando até as estrelas que espreitam do céu, depois de um sol invejoso se deitar com o oceano.
Um dia, vamos correr o mundo. O mundo poderá ser dois passos convergentes até um abraço cheio de cidades. E não vamos ter pressa, nem roteiro, nem destino. Apenas os braços um do outro, um sorriso nos lábios e um brilho no olhar.
Iremos a lugares que ninguém vai, por trilhos incertos. Cairemos aqui e ali no desconhecido. Mas vamos erguer-nos, erguer a esperança e confiar nas palavras nunca ditas do nosso coração.
Um dia, vamos abrir as asas e voar, à medida que o chão desaba sob os pés que firmámos durante tempo demais. E voaremos alto, voaremos juntos, enquanto as estrelas nos piscam o olho e a lua cresce no céu nocturno.
Iremos agarrar o café e a manta. Deitar no chão das nuvens a olhar o infinito. E vamos deixar que se dê um abraço entre as almas, enquanto cantas uma canção de embalar e deixas os dedos navegar nas ondas dos meus caracóis imperfeitos.
Um dia, serei tua e serás meu. Sem medo de perdermos quem somos por nos darmos. Sem medo de perder a liberdade por não querermos outra liberdade senão essa onde nos damos um ao outro.
Iremos adormecer abraçados e acordar com sorrisos comprometidos, por entre rostos sem maquilhagem e cabelos emaranhados. Riremos da forma sem jeito como me escondo debaixo das mantas e da forma desajeitada com a qual encaro tudo o que é novo.
Um dia, o sorriso vai transformar-se em rotina. Sorrindo, olharemos um para o outro e saberemos que tudo em nós foi certo, evidente, destinado. E o abraço das nossas almas ganhará raízes e asas, na certeza de que, por vezes, ser livre é apenas escolher ficar.
Um dia. Um dia, tu e eu seremos nós. Entre a simplicidade da minha lista de desejos, seremos mais do que a imaginação permite. Talvez sejamos eternos. Talvez sejamos poeira de um sonho real. Seja como for, tenho a certeza: quando esse dia chegar, seremos a expressão mais pura da felicidade.

Marina Ferraz
*Imagem retirada da Internet

terça-feira, 6 de agosto de 2013

Carta do amor


Pessoas do mundo,

Gostaria de vos perguntar como estão. Seria simples começar assim, pela pergunta retórica do óbvio. Mas não vou perguntar. Sei a resposta. Vocês estão feridas. Feridas pela oportunidade que passou ao lado. Pela traição desvendada. Pela discussão inacabável. Pela rotina sem fim que vos encheu os dias. Então, como eu sei a resposta, não vou perguntar.
Querem saber como eu estou? Eu estou ferido também. Ferido pela vossa insensatez. Ferido pela forma como usam o meu nome, sem o pensarem, sem saberem o que ele significa. Ferido pela culpa que me atribuem quando os vossos erros tornam a vossa vida um inferno.
Eu estou cansado. Cansado de ouvir dizer que a culpa é minha. Cansado de ser chamado, abandonado, espezinhado. Cansado de ser o tema interminável dos vossos diários, das vossas conversas, das vossas ilusões. Estou cansado de ser chamado em vão, no primeiro vislumbre do desejo. Cansado de ser tratado como o fruto podre de uma árvore que jamais deu flor.
Eu não tenho culpa. Não tenho culpa que a cada passo que dão julguem encontrar-me nem que me vejam em sítios onde eu não estou, em lugares onde nunca fui, em recantos que jamais visitei. Eu escondo-me bem dentro dos confins do tempo. Quando me virem de verdade já terão usado o meu nome erradamente, já me terão traído e odiado.
Eu não sou perfeito. Levo tempo. Tempo para crescer, tempo para criar raízes. E preciso que respeitem o meu tempo. Mas eu não sou cruel. Não sou o vosso eterno inimigo. Não construo a minha felicidade na vossa tristeza. Eu sou as estrelas que brilham mais, os pores-do-sol mais bonitos, o mar mais intempestivo e azul. Eu sou o verde das árvores. Eu sou o curso dos rios. Eu sou o sorriso breve, envergonhado. Eu sou a mão dada pelos caminhos e a promessa feita e jamais quebrada. Eu sou a dificuldade superada, a paciência infinita, o choro de mansinho na hora da partida.
Gostaria de vos perguntar como estão. Seria mais simples. Mas eu sei como vocês estão. Estão sentados, à espera que eu entre nas vossas vidas e resolva os problemas que dizem que fui eu a criar. Mas eu não entrei nas vidas de todos vocês e, certamente, nunca vos feri. Quem vos feriu foi a ilusão de que me tinham nas mãos. Quem vos feriu foi uma ou outra pessoa que, como vocês, não me viu.
Eu não nasci para me dar. Nasci para que me dêem e me recebam no peito. A culpa não é minha se a ferida nasce da ilusão antes de me agarrarem com a ternura de um embalo. Tudo o que eu quero é que sejam felizes, inteiros. Que encontrem as minhas metades e as juntem. Que sorriam, superem e sejam mais e melhor.
Querem saber como eu estou? Eu estou desiludido com o mundo. Desiludido porque quanto mais ouço o meu nome, mais compreendo que não sabem quem eu sou...


Eternamente vosso,
Amor

Marina Ferraz

*Imagem retirada da Internet