Sete. São sete. São sete as letras da palavra memória. E a
memória permanece. Permanece intocada nos recantos de tudo o que, afinal, não
era bom, não era para ser e nem tão pouco era real.
E falo da memória. Falo porque não tenho medo. Já não tenho
medo. Tenho só memória. Uma memória que se estende e se levanta, revelando o
que havia por detrás de um sentimento que nunca foi nosso mas apenas meu.
São sete. Sete letras da palavra memória que se prende a
sete anos de espera. Esperar por ti foi simplesmente esperar pela morte. Estava
à espera da morte e sabia-o. O que eu não sabia era que o amor andava aí, à
minha procura, à minha espera, dizendo que, algures, entre as árvores e os
monstros de pedra, alguém queria fazer-me feliz.
A memória diz que também me fizeste feliz. Momentos efémeros
de uma felicidade que se lavou com anos de lágrimas e amarguras. A dor era uma
parte incontornável de mim mas não era minha. Vinha dos teus silêncios, da tua
crueldade, da forma como usavas de mim somente o que era simples para
desapareceres nos ventos.
São sete. Sete anos. Sete anos que tiveram muitos dias. Em
qualquer um desses dias poderias ter mudado a história para criares uma memória
em que pudesse retratar-te de outra
forma. Mas escolheste assim. Escolheste ser alguém que nunca esteve e para quem
eu estive sempre. Alguém que deixava as promessas por cumprir, aglomerando-as
em estruturas de fel e pedra poida, para serem vendidas a preço de saldo.
Na minha memória os teus olhos já não brilham e o teu
sorriso já não ilumina. Porque a pessoa que eu um dia amei não existe atrás
deles. A pessoa que eu amei morreu há muito tempo atrás, deixando somente a
concha vazia e oca onde havia um ser humano que eu soube ser bom, decente,
apaixonado e completo. A pessoa que eu amei perdeu-se nos confins de tudo o que
nunca poderia ter sido para ter algo que eu não posso nem quero compreender. E
espero que tenha valido a pena.
Nunca soube tanto sobre o amor. Mas, pensando em ti, o
presente do verbo amar é "morreste-me". Morreste-me a ponto de te
tornares memória e da memória dizer que a espera foi inútil. A pessoa pela qual
esperei não poderia ter voltado porque, se alguma vez existiu, não existe mais.
Amei verdadeiramente a ilusão. Chorei verdadeiramente a perda. Não sei se a
mágoa era feita de amor ou luto. Sei que a palavra memória tem sete letras e
que durante sete anos vivi sete vidas que foram mortes acordadas.
Sete. Sete anos e tantos dias em que podias ter mudado a
forma como te revejo nas sete letras da memória. Sete anos para aprender que o
amor é feito de tudo o que eu nunca tinha tido.
Sete. São sete as letras da palavra memória. E a memória
permanece. Permanece intocada nos recantos de tudo o que, afinal, não era bom,
não era para ser e nem tão pouco era real. Mas não importa. Estou a cumprir a
promessa, com a memória pousada ao de leve sobre um coração que pecou, talvez,
por te ter querido tanto. Estou a cumprir a promessa. Estou finalmente a
cumprir a promessa que não fiz. Abri as asas e o céu chama. Adeus.
Marina Ferraz
Marina Ferraz
*Imagem retirada da Internet