A Lua olhou para baixo. Outrora fora o seu encanto. O mundo
dos homens fascinara-a, no tempo em que os homens eram do mundo. Lembrava-se
concretamente de rios sem barragens, de florestas sem gruas, de vilas sem
cimento. Lembrava-se concretamente do verde, do azul. Um diamante em bruto,
cheio de vida, sempre que olhava para baixo.
O Sol tinha-a avisado: "Não te iludas! Um dia, quando
te beijar, não vais olhar para baixo e sorrir. Há na aprendizagem humana todos
os meios que levam ao caos.". Ela tinha-o ignorado. O Sol podia ser quente
mas também era pessimista. Os humanos eram fascinantes. Honravam-nos com
oferendas e flores, com cânticos e orações. A Deusa Lua, o Deus Sol. Honravam a
Terra e a Água e o Ar e o Fogo. O Fogo... lembrava-lhes a alegria quando o
tinham descoberto.
Em tempos fora o seu encanto: olhar para baixo e encontrar
florestas virgens, rios indomados, mares sem portos, pessoas que sabiam qual a
imensidão da Mãe Natureza.
Então, por força do hábito, a lua olhou para baixo. Olhou na
busca de uma ilusão. Fitou primeiro os passeios cinzentos, depois a imensidão
vermelha e negra dos telhados, depois as florestas de betão. Suspirou. Era
triste olhar para o mundo, naqueles dias. Triste como imaginar uma noite sem o
beijo do Sol. Uma noite de escuridão.
Desviou o olhar. Acima de si, apenas o negro, ao seu lado o
seu eterno amante, debaixo de si a destruição. Queria chorar e não podia. Era
uma das coisas que nenhum Deus tinha dado à Lua: olhos que chorassem a
devastação que viam.
Lançou um olhar de soslaio ao Sol. Ele dormia, descansado,
com o brilho colado ao seu rosto. Como podia ele dormir tão descansado? O
mundo, abaixo deles, já não os honrava. As flores tinham dado lugar a
estatuetas disformes. Os rios corriam, imundos, para um mar tóxico que ceifava
a vida a tantos, tantos seres vivos.
A Lua olhou para baixo. Não porque houvesse algo que valesse
a pena ver mas apenas porque o caos lhe puxava o olhar minguante para um
infinito de nada. Desesperou nesse olhar, como tinha desesperado antes, tantas
vezes. O que seria de si quando os monstros voltassem? Destruiriam a sua face
com mais do que bandeiras e pegadas? E se, olhando para si, disforme como a
Terra, o Sol já não viesse para lhe beijar o rosto?
A Lua olhou para baixo. Se houvesse uma gota de água nos seus mares, teria
chorado. Como não havia, afastou-se um pouco do Sol e fez-se nova para que
ninguém, naquele mundo destruído, olhasse o céu e percebesse como ela estava
triste.
Marina Ferraz
*Imagem retirada da Internet
Retrata a realidade do mundo de hoje. Maravilhoso seu texto.
ResponderEliminarParabéns. !
Muito bem elaborado e muito bonito também.
ResponderEliminarParabéns! Virei fã!
Beijinho!
gostei muito e que admiro muito em teus textos poeticos e o parametro que fazes entre o mundo real fiticio embasado na vida e maravilhoso e tenho certeza que tu es uma revelação no mundo poeticos
ResponderEliminarMuito lindo querida,gostei bastante,tem um tom muito poético que me encanta. :D
ResponderEliminarParabéns,beijinhos Jenny ♥
Parabéns :v :v
ResponderEliminarUm Poema que de certa maneira retrata o estado do coração humano!...(apaixonado; desencantado; óptimista; cauteloso!... renovado!...)
Obrigada
F.F.
Tenho gosto por esse tipo de leitura,é muito bem elaborado.
ResponderEliminarParabéns
PASAM-SE OS ANOS E A POESIA E RENOVADA A CADA LEITURA E A OBRA DO POETA E RENOVADA A CADA LEITURA A CADA SUSPOIRO QUE NADA FARA APAGAR SUA EXENCI LITERARIA...INCRIVEL...
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