Para a minha irmã
“- What if I fall?
- Oh, darling… what if you fly?”
(Autor Desconhecido)
Foste a primeira a fazer-me voar. Pouco importa que tenha
sido irresponsável. Pouco importa que tenha sido um voo breve, sobre a sala e
na direcção do sofá. A verdade é que, quando ainda todos me tinham no universo
cuidado de colos e seguranças, tu acreditaste que podias – e que eu conseguia –
voar.
Naqueles dias em que, a partir da porta, me atiravas para o
sofá, acreditavas que eu não ia cair. E era essa crença que me fazia sentir
segura. Se podia ter-me espatifado no meio do chão? Podia! Mas nunca acreditei
que acontecesse. Nem tu. Amavas o riso. E eu amava a brincadeira. E vivíamos
bem nesse ciclo de cumplicidade. (Desde que a nossa mãe não visse…)
Algumas coisas definem-nos por um segundo. Outras definem a
forma como vemos a vida. A forma como eu vejo a vida é esta: no caminho do voo
existe o riso. Talvez caia, talvez não. O fundamental é tentar… E tudo na vida
depende do impulso que nos dão, à partida.
De menina a adulta, ao longo da vida, senti de ti o impulso.
Esse que me faz acreditar que consigo voar. Seja lá o que isso for. No amor, na
escola, no trabalho. De ti, senti sempre o incentivo. A crença. O orgulho. A
cumplicidade.
Aprendi contigo quão certos parecem alguns errados. E até
que alguns erros são certos. Nesse voo pelo que não é aceite (ou permitido),
aprendi que as normas raramente estão de acordo com a moral que pregam. Se nos
podam as asas, como podemos voar? Não! Não somos assim. Nem tu, nem eu. E, nas
nossas – muitas – diferenças, sabemos bem que o lugar onde acontece a
vulgaridade não nos serve nem nos completa.
Construímos a cumplicidade nas nossas diferenças, a
aprendermos uma com a outra um bocadinho sobre o que é ser mulher. Gosto da tua
força. Gostas da minha meninice adulta. Eu gosto da maneira como sorris com os
olhos, em alguns momentos. Será que alguma vez to disse? Falo muito em ti! Digo
que és mãe. Digo que és forte. Digo que és lógica e ciência. Digo que não
gostas de te cuidar e que te escondes um bocadinho… e que é pena, porque és das
mulheres mais bonitas que conheço. Às vezes descrevo-te a pele clara e os olhos
azuis… porque eles são lindos! Mas falo muito da beleza que te faz ficar para
terceiro plano, atrás das necessidades das pessoas que amas e das necessidades
das pessoas que nem conheces. És bonita por dentro. És bonita por fora. E só os
Deuses poderão saber quão bonita serias se soubesses que já o és.
Não dizendo nada disto, o que eu poderia dizer é: és a pessoa
que me fez saber que podia voar. Às vezes, é importante que nos dêem o impulso
inicial e nos atirem pelo ar do tempo, rumo a tudo o que podemos ser. Claro: Somos
irmãs. E tivemos brigas de irmã... algumas importantes, outras sem razão
aparente. Ainda bem! Discutir contigo e discordar de ti também me fez quem sou.
Foste a primeira a fazer-me voar. Quando eu não podia,
sequer, saber que existia um risco por detrás do voo. E, por me teres mostrado
o riso antes das lágrimas e o céu antes da queda, acabei por ganhar a confiança
que me fez lutar pelos meus sonhos. Quando ainda todos me tinham no universo
cuidado de colos e seguranças, tu acreditaste que podias – e que eu conseguia –
voar.
Presa à terra que te firma os pés no chão matemático da
vida, não sei bem se sabes que também consegues – voar. Mas eu sei que sim.
Estarei aqui para o impulso. No mar da nossa cumplicidade. E sempre que
precisares, sabes que tens de mim, não só o amor, mas também as asas que me
deste.
Marina Ferraz
*Imagem retirada da Internet
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