Aprendi a não lutar contra o vento. Se ele muda eu sigo. Vou
com ele. Deixo-o abanar os alicerces da minha vida. Não preciso de o
contrariar. De me agarrar à solidez dos passeios ou às muralhas de pedra firme.
Se o vento muda, eu sigo. Vou com ele. Não vale a pena contrariar as suas
vontades.
O vento soprou, durante milénios. Venceu exércitos e
estradas e desfiladeiros, pela erosão das vontades incautas dos seus
opressores. E nunca, em milhões de anos, deixou de seguir pelos caminhos que
julga mais certos.
Se segue para o Norte ou para Sul, se para Este ou Oeste,
fá-lo por sua vontade e contra quem quer que seja. Não tem medo e não tem
pressa. Por entre os compromissos adiáveis, tem apenas a eternidade para ir
onde quiser, no sentido que achar melhor.
Nesses caminhos, percorridos na constância inconstante do
ser, deixa-se usar mas não deter. E faz girar as pás de mil moinhos e bater
contra as paredes a roupa húmida, pendurada nas cordas de milhares de casas.
Deixa-se usar na consciência de que homem algum poderia erguer um muro que lhe
vedasse a passagem. Na consciência de que nada poderia alguma vez deter o seu
intento ou travar o seu rumo.
E, se nem os penhascos e os desfiladeiros lhe travam o rumo,
com a sua íngreme robustez de pedra, como poderia eu, ainda que tentasse,
vencer-lhe o desejo, contrariar-lhe a rota, ir por outro caminho?
O vento muda e eu vou com ele. Sigo-o aonde ele vai. Sem
olhar para os pontos cardeais dos meus desejos e sem segurar no peito a
tenacidade intolerante que me faria seguir por outro caminho ou simplesmente
ficar na estabilidade do local onde me sinto ganhar raízes.
Não tenho raízes mas apenas asas. Asas que abro e deixo que
me levem onde quer que o vento vá, na crença inabalável de que ele sabe onde
vai.
Aprendi a não lutar contra o vento. Se ele muda eu sigo. Vou
com ele. E eu sei que, mudando, ele sopra em direcções que me podem levar de ti.
É por isso que te estendo a mão. Não posso lutar contra o vento. Se ele muda,
eu sigo. Mas podes segui-lo também. Podes vir comigo. Assim, mesmo que o vento
mude, nunca haverá local onde não possamos estar juntos.
Marina Ferraz
*Imagem retirada da Internet