Ainda te lembras? O dia em que o viste pela primeira vez.
Aquele rosto de herói de telenovela, o semblante de artista de cinema. A forma
como, ridiculamente, não conseguiste descolar os olhos dele. A maneira como ele
te sorriu, devolvendo-te um olhar cheio de sonhos.
Ainda te lembras? Falaste dele à tua mãe, à tua irmã, às
tuas amigas. E riste da ideia de que o destino te pudesse levar ao encontro dos
braços dele. Mas ele levou. Não foi? Deste por ti a passear pelas ruas, perdida
em conversas que te pareciam mundos. E desejaste, em silêncio, que ele te desse
a mão. Não acreditavas que fosse acontecer. Mas aconteceu. Não foi?
Ainda te lembras? A passagem lenta, permeada de segundos que
eram horas, da mão dada à partilha do beijo. Ali, mesmo em frente ao rio. Com
as árvores de testemunhas e as nuvens apressadas para não choverem sobre o
nascer do vosso amor.
Ai! Como o amavas, nesse tempo em que ele te era improvável
e o improvável te acontecia. Amava-lo tanto que acordavas a sorrir. Cantavas
pela casa. Espetavas beijos repenicados nas bochechas dos teus pais.
Rodopiavas. Dançavas. Parecias tola. Sim! Parecias! Mas não eras... eras apenas
alguém que estava a encontrar, nas dobras da folha da vida, os primeiros
contornos do amor. E nascia, nesse valezinho da tua história, um pássaro que
era o sonho. Deixaste-o voar pelo céu da tua esperança. E ele voou mais alto do que podias sonhar.
Ainda te lembras? O dia em que ele te apareceu à porta,
engolindo em seco, para te dar um ramo de rosas e conhecer os teus pais. A
maneira como se sentou à mesa, por entre a paixão e o desconforto e anunciou
que tinha, por ti, apenas sentimentos caros e boas intenções. A maneira como o
teu pai lhe apertou a mão antes dele sair, resmungando entre dentes que nunca
ninguém seria bom o suficiente para ti. A forma como, olhando os teus olhos,
meios chorosos, acrescentou: "mas parece bom rapaz". E a resposta que
lhe deste: "é, papá, é o melhor homem do mundo".
Ainda te lembras? O melhor homem do mundo levou-te ao topo
da montanha, ajoelhou-se, estendeu-te o anel e implorou, mais do que pediu,
para que fosses dele. Justificou: "não quero viver mais um dia sem ti.
Quero morrer ao teu lado. Não há ninguém como tu!". E tu, que não
acreditavas que fosses especial, aceitaste-lhe as palavras e o anel. Subiste
com ele ao altar. Fizeste votos de amor perante a tua família, os teus amigos e
o teu Deus. E desceste na alegria de trazeres outro nome e a promessa de outra
vida.
Ainda te lembras? À medida que os anos passaram, ele deu-te
o calor das manhãs de sol com um beijo e a dádiva de dois filhos. Esteve ao teu
lado no nascimento dos dois, limpando-te o suor da testa e, desgrenhada e
pálida, olhou para ti e disse-te que eras linda.
Não creio que te lembres. Ouço-te dizer que não queres
voltar para casa. Que te cansa a presença dele. Que precisas de tirar férias do
teu casamento. Mas olha bem: sentado no sofá, ainda que tenha todos os defeitos
do mundo, está alguém que te deu os melhores momentos da tua vida, alguém que
te quis, alguém que te apoiou... Ainda é o mesmo homem do rosto de herói de
telenovela e semblante de estrela de cinema. Ainda é o mesmo homem que
descreveste como "o melhor homem do mundo".
Talvez, na ilusão do tempo, te cansem os pormenores
desengraçados do convívio diário. Talvez eles pareçam maiores do que os elogios
que lhe teceste. Talvez te sintas traída pela forma como a paixão virou rotina.
Mas lembra-te. Lembra-te dele. Lembra-te da forma como o teu coração batia na
presença dele. Acima de tudo, imagina uma vida onde ele não esteja. E valoriza
tudo o que terias perdido sem o amor.
Ainda te lembras? Os votos. "Vou amar-te para
sempre." Faz isso! Ama o amor. Ama-o.
Ele ainda está aí.
Marina Ferraz