terça-feira, 13 de outubro de 2009

Mural do Silêncio


Bateram palmas. Infinitamente. Sentia a pele queimar sob as luzes. Os meus olhos não podiam ver o rosto de ninguém. Bateram palmas ao segundo acto da minha farsa. Ainda tinha de voltar a palco e já estava farta de fingir. Estava farta de tentar procurar um sentido naquela peça de teatro constante à qual chamo vida.
Subi ao palco da minha morte vestida de vergonha. Suja de solidão. Rasgada de saudade. Bateram-me palmas e eu sorri. Sorri porque era o meu papel e porque havia uma nota no guião dizendo que o fizesse. A felicidade era da vida que representava e não da morte que vivia.
Continuei a dizer as minhas deixas. Cuidadosamente, sem falhar nenhuma, tendo em conta o tempo que passava no compasso do meu coração parado.
Ouvi as respirações sustidas e namorei o silêncio que as acompanhava. O silêncio era casa. O silêncio era abrigo. O silêncio era seguro. O silêncio preenchia-me como mais nada poderia fazer.
Bateram palmas. Não porque o meu papel fosse bom mas simplesmente porque eu era muito melhor actriz do que pessoa.
Agarrei no revólver e disse duas frases engraçadas antes de o disparar contra a minha cabeça e cair. O público riu e levantou-se para aplaudir o grande final. Eu já não estava a representar. Acabara a peça e a vida. Restava a morte. Só a morte. E eu estava finalmente em paz. Bateram palmas. Infinitamente. E eu nunca mais representei. Não se pode fingir a vida por muito tempo quando nunca se soube viver.

Marina Ferraz
*Imagem retirada da  Internet

2 comentários:

  1. Desculpa-me a demora, mas só hj é q deu, e pq o prometido é de vidro; como tal, parte-se!
    "Sorri porque era o meu papel e porque havia uma nota no guião dizendo que o fizesse.". "É só sorrir e acenar" minha prezada amiga [ia pôr aqui querida, mas n gosto, acho mt snob, embora esta expressão tb seja um bocado fria, adiante], e n há mt + a dizer. Sabes mt bem q esse teu texto corresponde a um estado de espírito q me é infeliz/ familiar. Há uns anos, a hipocrisia diária parecia-me inadmissível. Hj, já n penso tto assim. Deixei-me corromper, e se conseguir esconder, escondo. Pq nem sempre é bom e adequado revelar o q nos vai na alma. Então finge-se. É trabalhoso, porém, tem as suas compensações. Cm remate final, só te queria dizer 2 coisas: estás a escrever cada vez melhor, e temos q voltar a comer um daqueles gelados maravilhosos da emanha! Beijinhos

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  2. Para quando o livro de prosa?! Estou a ficar sem ideias para presentes de Natal x'D

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