Da rapariga que usa os brincos de pérola feitos de plástico
e da que usa a pulseira de prata feita de latão, dizem as raparigas que usam
peitos feitos de silicone em vez de carne que são falsas. Talvez sejam! Que
falsidade essa! Tão profunda e tão polida que se torna ricamente pobre.
Disfarça-se de dificuldade luxuosa. Tão falsas essas raparigas que se tornam a
elite dos cantos da rua. Que se disfarçam de mulheres e se fingem detentoras
natas de direitos que não têm! Quem as fez acreditar que podiam falsear as
jóias? Será que esqueceram o lugar que ocupam nos esgotos sociais?
Do rapaz que se comove com a comédia romântica e do que não
sai à noite para ajudar a mãe a arrumar a casa ou para cuidar da avó doente,
dizem os rapazes que se juntam junto às esquinas com copos de cerveja e
indecência na voz para falarem sobre as noites passadas com as miúdas a quem
partiram o coração, que são maricas. Talvez sejam! Que mariquice essa! Tão
profunda e tão intrínseca que faz deles avenida de impureza. Tão pouco máscula,
tão pouco de homem. Parece que grita num tom rosado qualquer, de céu de fim de
tarde, como purpurina no chão das boates de uma vida que ninguém quer. Será que
esqueceram que pertencem aos armários do silêncio?
Das mulheres que se dividem entre dois empregos, o cuidado
com os filhos, o casamento e as contas e as limpezas e o cuidado consigo
próprias, dizem aquelas que se reúnem para discutir a vida alheia sobre
cocktails, sob sombrinhas, nos clubes de elite, que são loucas. Talvez sejam!
Que loucura essa! Tão profunda e tão desengraçada que as torna velhas mais
cedo, acentuando as rugas do rosto e esmorecendo os sorrisos. E é porque
querem. Na desculpa da falsa pobreza, querem a loucura. Essa de não ter tempo
para o marido por causa dos filhos. De não ter tempo para os filhos por causa
da casa. De não ter tempo para a casa por causa do trabalho. Parece que se
esqueceram de viver sem a tecedura das desculpas. E não bebem cocktails.
Pobrezinhas. Será que esqueceram o lugar da mulher, que deve aguardar pelo esposo
no abraço das quatro paredes da casa? Será que esqueceram que devem tratar de
si para que ele a ame e da vida alheia para que haja tema de conversa?
Do menino que usa roupa de adulto porque a outra não lhe
serve e do que não consegue correr à volta do campo porque tem peso a mais,
dizem os que jogam futebol nas equipas juvenis e se apaixonam diariamente pelo
reflexo do espelho, que são balofos. Talvez sejam! Que gordura essa que se
acumula e abana, feito gelatina, nas barrigas abastadas dos que não têm outro
problema que não o do tacho e da meninice! Não é doença. É apenas mania. Apenas
uma forma de ocuparem mais espaço no mundo. Terão esquecido que existe um
espaço confinado para a sua presença? Quererão que se note que ali estão?
Quererão ocupar a cadeira deles e a dos outros?
Francamente! Os pobres, os gordos, os cansados, os
deprimidos, os homossexuais. Esses reprimidos. Francamente! O que fazem eles
neste mundo? Não deveriam estar noutro lugar? Onde não incomodassem os outros,
tão normais, tão dentro da norma, tão respeitadores da linearidade das coisas?
Não deveriam estar num lugar onde fossem apenas... pessoas?
Dos que julgam, dos que comentam, dos que abalam, dos que
maltratam. Dessas gentes normais. Dessas gentes que governam os países e o
mundo. Dessas gentes que dominam as escolas e se popularizam na vida. Não sei
se tenho o que dizer de todos eles. Vejo-os como são. Rosto de gente - tantas
vezes bonito. Corpo de gente - tantas vezes bem tratado. Vida de gente - tantas
vezes bem organizada. E acho-os feios. Acho-os feios nas palavras que dizem.
Nas que pensam. E, a cada segundo, vejo-os vencer batalhas de injustiça, cujo
prémio é pisar o outro sem motivo, sem resposta, sem retaliação.
Há uma feiura inerente no mundo. Nota-se menos no mundo das
pessoas bonitas e magras e heterossexuais. Mas está em todo o lado. E algumas
pessoas deviam maquilhar a alma... para esconderem como são feias por dentro.
Marina Ferraz
Este mundo é cheio de falsidade, por todos os lados, em todas as pessoas, em seus julgamentos sem limites e na grande mágoa a que somos expostos todos os dias,tentando ficar bem e pensar positivo,aliás,pensar positivo já é uma afronta àqueles que consideram que és um louco.
ResponderEliminarMas acredito que um dia melhore,espero realmente que sim,enquanto isso nos fazemos ouvir por aqui,com nossos protestos em formas de palavras e ironias que eles mal entendem.
Amei teu texto <3
Beijinhos Jenny ^.^
Simplesmente amei esse texto, já li vários outros, mas este toca-me a alma. Penso claramente assim, tive experiencias desagradaveis com estes tipos de pessoas por 17 anos e, não há texto melhor para representar minha opinião. Adoro seus textos Marina e seus livros também. <3 *-*
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