A luz do palco apagou-se. Com ela, deixo apagar o sorriso. Faço
uma vénia à solidão. Começa o segundo acto desta peça chamada vida. Aquele que
decorre sobre as tábuas esfarpadas do chão da realidade, onde caminho, de pés
descalços, sem outro texto que não o do pensamento. A luz do palco apagou-se. E
o sorriso, tal como a roupa, tal como os ornamentos, não era meu para trazer
para casa. Deixei-o lá, pendurado no cabide, juntamente com a ilusão.
A luz do palco apagou-se e estou cansado.
Ainda ouço os aplausos. Os risos. Gargalhadas. E a sombra do
desassossego, esquecida no camarote, juntamente com as mágoas e as desilusões.
Naquela casa de três paredes, conto muitas vezes a história de quem nunca fui.
E sou-o. Sou-o nos olhos das multidões contentes que riem e aplaudem e
incentivam.
Sou uma marioneta. Os meus fios puxados pela ilusão sadia de
que, um dia, as luzes do palco vão apagar-se e o sorriso não vai. Mas, todos os
dias, quando se apagam os holofotes, deixo no palco a pele e o sorriso e o
calor da vida. E preparo a alma para encarar o frio das ruas onde a morte
espreita e o sangue gela.
A luz do palco apagou-se. Com ela, deixo apagar o sorriso. Fecho-me
em mim. Custa ser eu. Não sei ser outra coisa. E arrasto os pés, pelos caminhos
cinzentos da rua suja, cumprimentando o vento e as estrelas. Tenho lágrimas
dentro da alma. E quero deixá-las verter. Mas fica-me o desconforto do choro.
Fica-me o desconforto de não ter, sequer, por ou para quem chorar.
A luz do palco apagou-se. Apago o sorriso. Fecho-me em mim.
E estou cansado. Avançando pela rua onde não há nada, compreendo que, entre o
palco dos sorrisos e o choro calado da alma, não há mais do que ruas desertas
onde fico sem mim, esperando que amanheça.
Vou só deitar-me um pouco. Estou tão cansado. Vou só
deitar-me por uns minutos. Ouvir o silêncio. O grito insensato do silêncio. Vou
só deitar-me um pouco. Aqui mesmo, no centro da rua. No centro da linha. No
centro da eternidade vazia de mim.
E sinto. O tremor. A promessa. A promessa insensata de que,
no final de todas as coisas, virá a recompensa. Talvez a recompensa seja o
sorriso. Talvez seja o choro. Não importa. Não quero saber. Quero só deitar-me
um pouco. Estou tão cansado. Tão cansado da vida. Tão cansado de mim.
O tremor. A promessa. O som. Acabou o segundo acto desta
peça chamada vida. A luz do palco apagou-se.
Deixo acender o sorriso. Tenho lágrimas nos olhos. E nunca mais estarei
triste.
Marina Ferraz
*Imagem retirada da Internet
Que texto perfeito *-*
ResponderEliminarActos da vida,chegam os sorrisos e se vão!!
Parabéns querida,beijinhos Jenny ♥♥