Pedes. Em tom de ternura. E eu recuso sempre. Sempre.
Porque me recordo dos segredos demasiado bem. Vejo-os expressos nas linhas do
meu rosto como cicatrizes de mágoa, sobre os locais onde tinha passado antes de
chegar até ti, com força suficiente para te ouvir pedir.
Conta-me os teus segredos.
Fico a olhar para as mãos. Tenho uma coleção de desgostos. Vou fazendo recortes e colando, um a um, cada momento de miséria na minha caderneta de sonhos. Acumulo-os. Mas não os digo. Não falo sobre eles. Ignoro-os. Faço de conta que não estão lá, sentados à nossa mesa, a olhar para nós com sorrisos lascivos, à espera da resposta, cada vez que me pedes.
Conta-me os teus segredos.
Reclamo dentro de mim a escuridão dos recantos inundados pelas lágrimas que chorei. Houve nascentes nos olhos que me desaguaram na alma. E fizeram mares que não secam. Nem mesmo perante o sol. Não secam e não aquecem. Talvez pela dimensão, talvez pela agrura. E mergulho nessas águas de gelo para descobrir que há um medo acutilante e presente, sempre que a tua voz se ergue. Sempre que ela o diz.
Conta-me os teus segredos.
Passado. Como uma agulha que se enlaça, fazendo nós em vez de pontos e querendo que o pano fique leve. E eu tento cortar, um a um, esses nós. Desfazer-me das memórias. Deixá-las pousadas num canto qualquer, onde ninguém vá e ninguém saiba. Mas as recordações são nós que se prendem ao tecido da minha pele e que enquistam no silêncio, cada vez que me pedes.
Conta-me os teus segredos.
Olho-te. Amo-te. Sou eu. Eu e os meus segredos que não digo. Não me roubes os meus segredos! Não me roubes de mim! Sou tudo o que tenho e não valho nada. Não me roubes com pedidos como esse.
Conta-me os teus segredos.
Aqui está um. Tenho medo. De contar. Os meus segredos. Depois vais embora e não vai haver ninguém para o dizer. Para o pedir.
Conta-me os teus segredos.
Marina Ferraz
*Imagem retirada da Internet
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