Fotografia de Ricardo Torb
Todos os meus
músculos chamam por ti. Todos. Tensos, cheios de emoções. Todos os meus
músculos chamam por ti. E eu tapo o rosto. Fecho os olhos. Finjo. Finjo a
realidade. Essa que sabemos – tu e eu – sobre todos os meus músculos. Peças de
corpo intransigentes e de vontade própria. Todos os meus músculos chamam por
ti.
Tento justificar
com a música que toca a reação incansável dos músculos que enrijecem. Digo. É porque a música mexe comigo. E,
algures, até a voz da cantora soluça, num riso calado. Como se… Até o guitarrista ou o baixista falham um acorde. Como se… E é improvável que o façam,
porque é uma gravação a passar na rádio. Mas fazem isso. Apenas para se rirem
de mim e da minha tentativa de justificar porque é que os olhos estão
brilhantes e os músculos enrijeceram.
Claro que o corpo
é poema. E é muito simples justificar qualquer coisa literariamente. Porque a
literatura, como se sabe, é mentira. E, se nela reside desejo ou dor; vontade
ou paixão, pode ser apenas para colorir as páginas. O poema é arte carnal,
visceral. Vem das entranhas. E explica-se com facilidade que os músculos reajam
a mentiras cáusticas. Não é por ti. É
isto que o poema diz. Mas depressa se lança em semânticas raras, onde se coloca
em causa a mentira da verdade e a verdade da mentira, até que a confusão é
tanta, que sobra só mesmo corpo sem poema no próprio corpo do poema.
Ser poeta é isso.
Osso e sangue. E patologias. Muitas. Do foro psicológico, na sua maioria. Todas
amalgamadas em pedaços inconcretos de estrofe. Misturadas em frases que
ornamentam folhas. E, principalmente, em palavras que nunca chegam a tomar
forma em lugar nenhum, senão entre sinais bioelétricos dentro da
invisibilidade do que fica atrás dos olhos que cegam por ver dentro.
E os músculos
continuam tensos. Quentes. Tensos. Estirados. Desde o rosto, onde os olhos se
fecham para te ver. Ao coração, que acelera para te sentir. À barriga, que se
comprime para tentar acalmar as borboletas e todos os outros animais de zoo que
insistes em colocar lá dentro sempre que te penso. E os músculos continuam
tensos. Quentes. Tensos. Estirados. Desde as maçãs do rosto, que enrubescem.
Aos braços que se agarram um ao outro para evitarem lançar-se na busca do
impossível. Às costas, de asas interinas, que não rasgam a carne porque, se eu
voasse, não resistiria em espreitar pela tua janela, apenas para, num
vislumbre, saciar o meu indiscreto desejo de ti.
Deixo-me ser
poesia. Dessa que é visceral e totalmente louca. Detesto! Detesto as minhas
rimas imperfeitas! Faltas-me tu para que a métrica bata certo. E eu continuo a
mudar mobiliário orgânico da esquerda para a direita e da direita para a
esquerda, embatendo em duas ou três teorias antifascistas, antes de compreender
que o problema não está na disposição dos órgãos mas no vazio das paredes.
Sinto-me só.
Custa muito admitir que me sinto só. Principalmente quando a pele nua tem
músculos tensos. E eu entendo a sua linguagem e sei. Sei que todos os meus
músculos chamam por ti.
Todos.
Mas principalmente o meu coração.
Sigam também o meu instagram, aqui
lindíssimo ...
ResponderEliminarlindíssimo... como tu
ResponderEliminar