“Perder-se também é caminho.”
- Clarisse Lispector
- Que lugar é “aqui”? – pergunto, sem saber onde estamos, porque estamos sempre entre o lugar onde dissemos que íamos e o lugar onde já estivemos e os lugares onde poderíamos ir.
Se respondesses, talvez me dissesses que “aqui” é onde tu estás. Mas tu não estás onde eu estou. O peso que a alma me perde quando vais para esse “aqui” que não é meu, faz-me desaparecer nos meandros da sombra de um “eu” que também não me pertence. E o teu “aqui” não me serve. Justamente porque a alma perde peso quando vais. E o coração vai, arrancado do peito, dar-te razão ao “aqui” onde tu moras e eu não.
Intercalo entre a pergunta e o silêncio. A mente constantemente dançando com os fantasmas do anteontem, imersa na imortalidade das palavras que me faz escrever e desejando a morte que já tarda há demasiadas vidas.
Não sei onde estou, concluo.
Olhando em redor, sem bússola nem mapa, sou o espelho das palavras de
Lispector. Ao perder-me na estrada – será isto uma estrada?! – percebo a
vontade própria das pernas que avançam e avançam e avançam. Passos de bebé.
Passos de gigante. Passos de corrida. Passos de boneca. Passos de urso. Passos
de bailarina. Mamã dá licença? Nunca
se chega a lugar nenhum e o jogo continua. Mamã
dá licença? Quantos passos?
Deixei a contagem dos passos para quando souber onde estou. Agora não sei. Talvez nunca tenha sabido. Ou talvez tenha sabido apenas quando, mergulhando o corpo nos teus braços e o nariz no teu pescoço, descobri o único sítio onde quero estar. Mas foi tão breve a passagem por esse santuário só meu – e nunca meu – que é como se nunca tivesse sabido. Onde estou. E, mesmo aí, precisei de perder-me para me encontrar, precisei de perder-me em ti. Talvez ainda aí esteja. Perdida...
Penso que deve ser estranho ter respostas para as perguntas de retórica da mente que vagueia. Estar perdido é-me forma de andar. Estar perdido foi sempre, para mim, forma de andar. Pelas caves. Pelos cortes. Pelos pensamentos itinerantes, nómadas e pouco saudáveis de uma mente que podia desligar as emoções. Só as emoções. E, com elas, o desejo de saber onde está.
Quem sabe sempre onde está, está no lugar errado. É esta a conclusão que tiro, ao perceber que foi perdida que estive no sítio certo. Quem sabe sempre onde está, está no lugar errado.
- Que lugar é “aqui”? – pergunto, novamente.
E tenho a certeza de que me dirias que “aqui” é onde tu estás.
Eu também acho que “aqui” é onde tu estás.
Onde estás?
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