terça-feira, 29 de abril de 2025

Rescaldo

 


Ontem foi Dia Mundial da Segurança e Saúde no Trabalho e dia de apagão. Hoje é Dia Mundial da Dança e de rescaldo nas redes sociais. Há dias para tudo!...

 

Mas hoje... hoje é um dia especial. E é um dia especial porque ontem foi um dia especialíssimo. Se a luz ao fundo do túnel já se tinha apagado (ou pelo menos esmorecido até ao ponto em que se torna impercetível a olho humano), a decisão súbita de toda a outra luz fazer o mesmo pareceu despertar algo há muito adormecido nas pessoas. Então, hoje é um dia especial. Hoje, nas redes sociais, é dia de rescaldo, de reflexão, de explorar o apogeu da auto-sabedoria. Dia de verbalizar literariamente o fruto da sua meditação. Dia de dizer, no fundo, qual a lição dada pela emergência mestre da véspera.

 

Quero fazer diferente e vou dizer o que não aprendi. Eu não aprendi que a luz é fundamental. Eu não aprendi que a água é fundamental (sim, também fiquei sem água!). Eu não aprendi que estar dependente de terceiros é limitador. Eu não aprendi que ter um fogão a gás é melhor do que ter uma placa elétrica. Eu não aprendi que faz falta podermos contactar quem amamos. Eu não aprendi nada disto ontem. Aprendi isto mais ou menos pela altura em que me levantava às sete da manhã porque queria ver os bonecos animados e em que a minha noção de sucesso para o futuro seria tornar-me a Power Ranger Amarela.

 

Ontem, quando muito, comprovei os limites da minha própria preguiça. Tinha garrafas de água para encher, que permaneciam vazias na bancada... porque tive preguiça de as encher quando havia água nos canos. Aproveitei que não havia eletricidade e descongelei o gelo para ter água... porque tive preguiça de ir comprá-la. Fiquei por casa porque, honestamente... é um oitavo andar e, como devem imaginar, o elevador não funciona durante um apagão.

 

Ontem, pensei nos hospitais, em pessoas que pudessem estar presas em elevadores ou no metro, nas atarefadas funcionárias que provavelmente fizeram o trabalho mensal de bíceps a passar aos vinte garrafões de 5L de água de cada vez, açambarcados por imbecis que não entendem que os recursos devem ser para todos e não para seu uso pessoal, único e exclusivo. Pensei na minha família e decidi – nada novo, também aqui... é uma decisão que já tomei noutras alturas, incluindo durante a pandemia – que se isto continuasse iria ter com eles, porque detesto não saber como estão. E pensei nos povos em guerra, nos sem abrigo, nas pessoas que vivem em condições deploráveis, em países de terceiro mundo, de segundo mundo, de falso primeiro mundo. Pensei como nos achariam ridículos por nos queixarmos tanto, por tão pouco.

 

Estou muito longe de ser o espelho da moralidade... e também não quero sê-lo. Honestamente, ontem estive entretida a trabalhar enquanto o computador teve bateria, continuei a ler O Adeus às Armas que estou quase a acabar, bebi vinho tinto numa caneca do Star Wars (porque, vocês sabem... há que poupar a água... o gelo não era muito...), fiquei a ver as luzes acender ao longe e as estrelas na minha marquise...

 

Depois a luz voltou também ao meu bairro. As pessoas celebraram na rua, com gritos, palmas e assobios, como se fosse um novo ano que começava. E, hoje, transportaram a emoção do momento para o registo do aprendizado numa longa e detalhada lista digital, que só puderam publicar porque há luz...

 

Eu sou a mesma pessoa que eu era há dois dias. Se calhar, durante um tempo, vou combater a preguiça e encher as garrafas com água. Se calhar, vou comprar uma lanterna. Mas fundamentalmente não mudei, não me tornei melhor, não descobri a importância de nada novo...

 

As pessoas querem sempre que tudo seja um momento de epifania. Bom para elas! Talvez sejam, na verdade, mais felizes que eu... melhores do que eu...

 

Mas fica a pergunta... foi a rede elétrica que caiu. Já alguém lhe perguntou se se magoou?


Marina Ferraz




Fiquem atentos ao meu Instagram para saberem todas as novidades em primeira mão!




Se quiserem adquirir o meu livro "[A(MOR]TE)"

enviem o vosso pedido para marinaferraz.oficial@gmail.com


terça-feira, 22 de abril de 2025

Terra (Olha para mim)

Vídeo de ADN Agência de Notícias

Documentário: @Paulo Oliveira | Texto e interpretação: @Marina Ferraz | Drone: @David Duarte



Olha para mim.

 

Não. Não olhes como olha quem tem olhos e não vê.

 

Olha para mim.

 

Olha-me quando sou semente, quando sou sol, quando sou vento. Olha-me e vê-me no correr do rio. No estalar da argila. No dançar das canas. Olha-me e vê-me na espuma que fica depois da onda, na onda que vem, e vai, e volta... para partir novamente.

 

Não vás. Não vás pelos caminhos de estrada e betão.

 

Segue-me até ao trilho de montanha. Desce comigo ao vale. Encara o nascimento e morte dos dias.

 

Olha-me. Olha-me na noite. Olha-me os ornamentos cintilantes das estrelas. A luz reflexa do luar. Aprende a amar o que fica longe demais para tocar. Aprende a amar o que tem fases. O que mingua e desaparece, para aumentar e ser farol noutro dia.

 

Olha para mim.

 

Olha para os seres que correm entre as ervas. Olha para os pássaros que voam. Observa como planam e cantam. Aprende, com eles, a arte de migrar. Tudo é viagem...

 

Olha para mim. Conhece a arte da serenidade. Descobre que o ciclo, o círculo, é vida. Mesmo quando culmina num último sopro.

 

 

Escuta-me.

 

Não! Não escutes como quem apenas ouve.

 

Escuta o som das minhas entranhas. Quando falo. Quando canto. Quando grito. Quando expludo. O vulcão. O grilo. O restolhar das folhas. O eco do trovão. O canto das ondas, essas sereias de tempo imemorial e sonho. Ouve o borbulhar das águas vulcânicas. O ceder da pedra na encosta. O pássaro. A cigarra. O roer inconstante da madeira velha pelos bichos-gente que a povoam. Ouve o clamor leve das estações que passam. O ranger dos troncos. O correr da ribeira. O adormecer do sol no oceano. O som que os dedos da via láctea arrancam das teclas negras da noite.

 

 

Toca-me.

 

Não! Não me toques breve, inutilmente, com essas mãos que não sentem.

 

Toca-me num mergulho inteiro. Mãos enterradas na areia e acariciando os troncos. Corpo dado à maré-cheia. Enlace de dedo com folha. De dedo com flor. De dedo com pelo. Toca-me como quem ama. Sente o veludo e a rugosidade da minha pele sem corpo. Crava o toque nas entranhas viscosas das minhas vísceras. Toca-me. E sente-me.

 

Descobre que sou tecida de texturas dispares. Que sou camada sobre camada sobre camada de muitas sensações que não são para quem fica à superfície. Madeira e água. Pedra e terra e corpo. Corpo-escama. Corpo- pena. Corpo-pelo. Carapaça e nudez anfíbia, fria e furtiva.

 

 

Prova-me.

 

Não. Não me proves. Saboreia-me.

 

Lambe o tecido férreo dos meus minerais. Entende a subtileza dos frutos sadios que crescem na orla das montanhas. Trinca a maçã verde e a amora silvestre e a laranja de inverno.

 

Sente o sabor da chuva e do trovão a picar nas línguas atentas. E o sal que fica na pele depois do mergulho. E a sensação doce e fresca da água colhida nas nascentes.

 

Saboreia-me em pratos de respeito. Honrando a morte de cada vegetal e fruto, assim como a de cada ser que te alimenta. E conhece-me o acidulado, o dulçor, a mistura inebriantemente agridoce do meu âmago.

 

 

Cheira-me.

 

Não! Não como quem busca o perfume encapsulado e constrito. Não me conhecerás em qualquer perfumaria. Mas vem...

 

Vem cheirar o começo do verão. A neve. A floresta cerrada, encerrada, onde as folhas fazem cama que será alimento. Os jardins floridos. Os pomares. O pelo molhado dos animais. A erva pisada, cortada, crescida. O vento do sul. O vento do norte. A areia beijada de mar. A salina. O fogo. A terra sulfurosa das ilhas. O ar marinho pela madrugada. O ar.

 

Vem sentir o aroma do outono, diferente na queda de cada folha. E sente o cheiro da poesia, que emana. Sempre. Se escolheres cheirar como quem vive.

 

 

 

E, depois, entende.

 

Não entendas como os doutos eruditos das academias, mas como os despretensiosos sábios do burgo...

 

Quando me olhares. Quando me escutares. Quando me tocares. Quando me provares e cheirares. Terás então marcado encontro contigo mesmo.

 

 

Descobrirás quem és: Espelho e pertença... A raiz do átomo e do universo.

 

Tu és eu e eu sou tu.

 

Natureza.

 

 

Pena que não olhes. Pena que não escutes. Nem toques ou proves ou inales essa essência de ti.

 

Porque sou tua Mãe.

 

E, doce humano, por mais cruel que sejas, por pior que faças... quando te olho, escuto, toco, provo e cheiro... vejo essa raiz de matéria sonho.

 

Então dou-te abrigo e embalo-te.

 

Até que acordes os sentidos.


Marina Ferraz




Fiquem atentos ao meu Instagram para saberem todas as novidades em primeira mão!




Se quiserem adquirir o meu livro "[A(MOR]TE)"

enviem o vosso pedido para marinaferraz.oficial@gmail.com


terça-feira, 15 de abril de 2025

A cama-baú

 

Imagem gerada por I.A.

Comprei uma cama-baú. Julgo que este foi o começo dos meus problemas. Comprei uma cama-baú. Dentro da minha cama há cobertores e mantas, lençóis e colchas. Comprei-a por isso. Porque me dava jeito o espaço de arrumação, numa casa onde o único armário embutido fica na entrada (o que só faz sentido quando nos recordamos de que a maioria dos arquitetos na época de construção do prédio eram homens!).

 

A colocação absurda do armário na entrada, no entanto, não foi o começo dos meus problemas. O problema foi mesmo a igualmente absurda decisão de comprar uma cama-baú. Tenho a certeza de que foi esse o começo do problema. Porque os monstros deixaram de poder esconder-se debaixo da cama, não tinham armário no quarto, e decidiram, todos de uma vez, voltar para casa da mãe... assentaram arraiais no meu peito e, desde então, é um vê-se-te-avias.

 

Dentro de mim anda tudo desarrumado. Tenho meias espalhadas por todo o lado (seriam inteiras, mas eles partiram quase tudo), está tudo sujo com uma poeira datada e negra, cheira a mofo e a desassossego. Não contentes com a confusão, foram à caixa das recordações e começaram a emoldurá-las. De repente, todas as faltas me fazem mais falta. Uma reposição de sentimentos que estavam resolvidos, lutos desfeitos e espalhados nos recantos de mim.

 

Gostava de poder pagar-lhes um quarto algures, para lhes dizer, de uma vez por todas que o meu peito não é uma república coimbrã. Mas – bênçãos da inteligência artificial – o que ganho agora mal dá para pagar as minhas contas, quanto mais as deles.

 

Não devia ter comprado a cama-baú. É certo que tem arrumação e que até foi baratinha... mas devia ter comprado uma cama com pernas, para o diacho dos monstros se manterem na sua saudável vidinha e só me fazerem cócegas à noite, com tentáculos permeando os sonhos notívagos.

 

O meu peito é, agora, o armário embutido onde se escondem. Sinto-os debruçados nas janelas dos meus olhos, em plena noite, acordados como se os alimentasse a cafeína. Lá ficam, a atirarem balões de água aos transeuntes. Eles rebentam e molham-me a almofada.

 

Sinto-me cansada como se nunca dormisse. Apesar de ter uma cama-baú com um colchão suave e macio.

 

Sinto-me cansada. A culpa é dos monstros desalojados. E também dos que se alojam em altos cargos, fazendo a mesma triste figura, mas dentro de fatos que eu não poderia pagar.


Marina Ferraz




Fiquem atentos ao meu Instagram para saberem todas as novidades em primeira mão!




Se quiserem adquirir o meu livro "[A(MOR]TE)"

enviem o vosso pedido para marinaferraz.oficial@gmail.com

terça-feira, 8 de abril de 2025

Sobrevivência

 

Imagem retirada do Pixabay

Há um motivo para que a palavra sobrevivência seja feminina. Desengane-se quem acha que não existe um alvo nas costas de todas as mulheres. Um medo que não é inerente à condição, mas que nasce, muito cedo, em pequeníssimas coisas gigantes.

 

Reconhecemos a que classe pertencemos muito cedo. Começa com coisas tão simples como um “quando fores grande podes ser...”. Tão inocentemente dito. Com tão boa intenção. Sem que mães e pais e cuidadores entendam que beberam do patriarcado. Até esse segundo, nenhuma menina imaginou que não pudesse fazer o que quer que fosse... Ali. Assim. Nasce. A dúvida. O entendimento. Amargo. Há caminhos vedados porque, se estivessem abertos, deles não se falaria.

 

Dessa frase nascem outros desafios. Podes ser o que quiseres. Dizem. Mas, mulher no meio de homens, perceberás que existem lugares onde trabalharás o dobro para receber metade. Perceberás que serás encarada como um pedaço de carne laboral, onde chefes e colegas frequentemente querem meter os dentes, e que chefes e colegas provavelmente verão apenas na condição de mulher. E todo o trabalho mal feito será porque o és. Mulher. E todo o trabalho bem feito será apesar de o seres. Mulher.

 

Esta é uma realidade transversal, para a qual felizmente há exceções. Felizmente existem. Infelizmente são raras. Raras, como o é o acesso a trabalhos que se consideram apenas masculinos ou cargos de poder muito elevados. E dirão. Existem mulheres nesses cargos. Nesses trabalhos. Eu sei. E, mais uma vez, raros são os casos em que o que temos, nesses cargos e trabalhos não sejam, na verdade, mulheres que se vergam ao seu lado mais masculino para pertencer. Lembro-me sempre de uma história que me contou um Técnico de Petróleos sobre uma mulher que, estando na messe, foi questionada sobre o que achava do assédio, tendo respondido um categórico “acho que há pouco”, que levou todos ao riso. É a ânsia de fazer parte, quando se sente que não se faz parte. Quando o mundo não deixa que desapareça a nuvem que chove sempre nas cabeças femininas. A ambição obriga à adaptação. Temos muitos camaleões. E, das suas bocas, frequentemente saem comentários que querem ofender (e por vezes ofendem mesmo) as mulheres livres, que se recusaram a vergar.

 

Podes ser o que quiseres. Mas não livre. Porque tens de ter cuidado com o que vestes. Com a hora a que vens para casa. Com a forma como falas. Sorrir? É insinuação! Chorar? Estás com o período! Brincar? Flirt! Um ar sisudo? Falta de sexo! Fora de casa - se não for também dentro – uma mulher não pode ser tudo o que quiser. Pode ser tudo o que o patriarcado deixa. E, frequentemente, o que a mulher pode ser é vítima de violência doméstica, psicológica, laboral, sexual...

 

Sobrevivência não é uma palavra feminina por acaso. E não, este texto não tem piada nenhuma, porque não consigo encontrar forma de me rir. Talvez esteja com o período, talvez seja falta de sexo, talvez seja a maldição de ter olhos na cara e neurónios funcionais...

 

A minha mãe também me disse que eu podia ser o que quisesse, quando era pequenina. Mas disse-me já mais de vinte vezes, depois disso, que eu não posso mudar o mundo. Acho que até ela sabe que isto é antagónico.

 

Gostava de ser bomba. Mas sem violência. Explodir compaixão e entendimento. Filosofias válidas e noções de empatia. Não podendo ser o que quiser, sou o que me permite o código legal. É proibido por bombas dessas, não vá a ordem mundial reorganizar-se e mandar abaixo um sistema que serve tantos! Sem poder ser o que quiser, sou hoje uma pessoa a escrever este texto, que provavelmente não será lido por muita gente.

 

Sabem que mais? Se fizer a diferença para uma pessoa... nem que seja para que não se sinta só na sobrevivência... já fico feliz. Mas, Deuses, não devia ser preciso este texto. Nem lutar assim. Nem sobreviver. Devia ser só viver. Devia.


Marina Ferraz




Fiquem atentos ao meu Instagram para saberem todas as novidades em primeira mão!




Se quiserem adquirir o meu livro "[A(MOR]TE)"

enviem o vosso pedido para marinaferraz.oficial@gmail.com


terça-feira, 1 de abril de 2025

72 horas

 

Imagem gerada por I.A.

Um alerta da União Europeia veio informar as famílias de que devem preparar-se para ter em casa mantimentos para sobreviverem durante 72 horas. Esta, que é uma estratégia de preparação para “eventos externos”, atingiu os europeus qual sismo, fazendo-os tremer face ao futuro. E, de súbito, eu fui também abalada por questões - algumas fruto do meu próprio privilégio, admito – mas outras da observação do mundo.

 

A minha primeira pergunta foi: quem raio não tem em casa os essenciais para sobreviver durante 72 horas? Certo é que, quando vou aos supermercados e me deparo com as filas infernais, quase parece que toda a gente vai lá diariamente. Mas eu sou a pessoa que equipa o carrinho com o suficiente, no mínimo, para tentar não lidar com as pessoas e as filas todos os dias... E, claro, há dias em que se abre a despensa e não há aquilo que nos apetece... mas em caso de absoluta necessidade, tenho a certeza de que se inventa qualquer coisa para comer, nem que seja com aquele produto enlatado que se comprou já-nem-se-sabe-quando-ou-porquê, mas que ainda está dentro do prazo de validade. Além disso, diz a ciência, o corpo humano está preparado para sobreviver entre 30 e 60 dias sem comida e entre 3 e 7 dias sem água. Ou seja: os essenciais para sobreviver durante 72 horas são, literalmente, porra nenhuma!

 

Seja como for, a União Europeia está preocupada e a alarmar os europeus. O alarmismo já provou que funciona. A trela do medo é curta e as suas lentes transformam facilmente tiranos em salvadores.

 

O kit de sobrevivência de 72 horas, no entanto, não parece incluir enchidos, vinho tinto e lugares para jogos de futebol. Acredito que os portugueses continuem a assobiar para o lado... evento externo, por aqui, é quando o Benfica não joga em casa. E, seja ele campeão... tudo se resolve!...

 

Portugal - e nisto temos que lhe tirar o chapéu! - está a preparar os cidadãos para este tipo de notícia há anos! Hoje, a maioria das pessoas sabe sobreviver! Sabe-o, principalmente, porque não consegue viver... Em algumas casas, quando há festa e se comete a loucura de fazer cozido, ele tem sobrevida em massa de carne, pataniscas de carne, arroz de cozido, arroz de carne, massa com carne e enchidos, sopa de cozido e sopa de osso. E, isto é no mundo das famílias ainda beijadas de privilégio... Porque casa em que acontece poupar-se é casa que ainda se tem... e tanta gente não tem...  

 

As tendas – onde não há cozinha ou despensa - criam pequenos condomínios públicos... tão públicos que ficam na via pública, não há despensa para guardar mantimentos para 72 horas. (Se isto vira lei, ainda os multam por isso!) Seja como for, a verdade é que estamos a falar de seres humanos treinados para a crise. Seres humanos que facilmente aguentam 72 horas sem comer. Alguns deles, andam a treinar há anos...

 

Na União Europeia deviam estudar Portugal!

 

Somos um país de gente cada vez mais capaz de sobreviver a eventos externos! É sobreviver aos eventos internos que está a tornar-se complicado...

 

 

(Sabem? Os nossos partidos são como aquele produto que se comprou já-nem-se-sabe-quando-ou-porquê, mas que ainda está no armário. Se estão dentro do prazo de validade? Não sei! Tenho as minhas dúvidas... mas tudo bem cozinhado, apesar de alimentar infinitamente os media, é tão poucochinho, que estou certa de que não daria para alimentar uma família real por 72 horas!)


 Marina Ferraz




Fiquem atentos ao meu Instagram para saberem todas as novidades em primeira mão!




Se quiserem adquirir o meu livro "[A(MOR]TE)"

enviem o vosso pedido para marinaferraz.oficial@gmail.com

quarta-feira, 26 de março de 2025

A mancha

 

Imagem gerada por I.A.

A minha casa antiga era fria e húmida. Por vezes, nos dias mais chuvosos, a humidade parecia entranhar nos ossos. O calor do ar condicionado que acabei por instalar – e que me custou um rim – dissipava depressa. Por consequência, já se adivinha... a conta da eletricidade subia astronomicamente no inverno.

 

Mudei-me.

 

A minha casa nova não é tão fria. Também é menos húmida. Fica num oitavo andar e tem vistas magníficas para a serra. Mas há uma parede que tem uma mancha. E essa mancha, a pouco e pouco, embora não me pareça que esteja a alastrar, foi-se tornando o meu novo bicho-de-sete-cabeças. Ou, pelo menos, um quebra-cabeças. A mancha não vem do teto. Não passam canos nessa parede. Não encontro nenhuma justificação minimamente válida para que ela tenha surgido. O que chamar? Um empreiteiro? Um canalizador? Um detetive privado? Não saber é o que me vai matando, enquanto espero que a vida me dê o tempo (e o dinheiro) de que preciso para resolver o problema.

 

Entretanto, existem dias nos quais a mancha me é quase indiferente, e outros nos quais me ofende. Dias nos quais passo por ela, alheada, e outros nos quais é a fonte de um começo de depressão. Há dias em que me apetece sair para não a ver. Dias em que me apetece arranjar um cavalo e lutar contra ela, num cenário apropriado de Marina de La Mancha. O que teria Cervantes a dizer sobre isto?

 

Nos piores dias, sinto que gostava de pôr uma bomba ali. Se não houver parede, não há mancha. Digo. Noutros, desespero e acrescento: devia ter ficado onde estava!

 

O certo é que, nesta azáfama de dias em que a mancha não importa e de dias nos quais a mancha é a minha inimiga fidalgal, os meus dias vão ficando também manchados, mas o meu entendimento fica mais claro...

 

Quando dou por mim a dizer que talvez devesse ter ficado na casa antiga, porque ao menos já lhe conhecia as mazelas, há algo em mim que me explica o pensamento de quem continua a votar em quem mancha o país e as vidas de tantas pessoas.

 

Neste pensamento, é engraçado... a mancha da parede da minha casa nova deixa de importar. País vira mundo, como se a cabeça corresse, uma a uma, todas as notícias conhecidas, demorando-se nas entrelinhas e em tudo o que sabe que não foi (não é!) dito.

 

O mundo em que vivo está manchado. Constato. O que tenho na parede não é uma mancha. É uma metáfora. Porra... agora não sei se chamo um empreiteiro, um canalizador, um linguista ou alguém que faça um exorcismo...


 Marina Ferraz




Fiquem atentos ao meu Instagram para saberem todas as novidades em primeira mão!




Se quiserem adquirir o meu livro "[A(MOR]TE)"

enviem o vosso pedido para marinaferraz.oficial@gmail.com

terça-feira, 18 de março de 2025

Ficheiro

 

Imagem gerada por I.A.

Ouço falar de um Portugal retrógrado, atrasado, a viver de um passado de glória. Mas temos assistido, cada vez mais, a um cenário diferente. Avançado. Que tem todos os sintomas das novas tecnologias.

 

Vivemos entre zeros e uns. Um código binário. Partidário. Em que as conjugações ilegíveis são processadas de forma inteligível para a maior parte das pessoas e invisível, dentro dos possíveis. Tudo corre e se decide de forma mais ou menos encapotada, atrás de um protetor de ecrã conhecido como Canal Parlamento.

 

Os ficheiros vão sendo criados. Um atrás do outro. E há quem os apague. Quem lhes mude o nome. Quem vá buscá-los à Reciclagem. De repente, as verdades sabem-se. Descobrem-se os ficheiros ocultos, mesmo quando protegidos com sei-lá-eu-quantas palavras-passe. Mas... quando são para abrir.... erro!

 

Erro atrás de erro. Dois cliques no ficheiro. O ficheiro não abre. Avisos vários saltam para o centro do ecrã. Desesperam. Vemos os partidos a tentar perceber o que deu errado. Mais fácil seria encontrar o que deu certo. Fazem de tudo. Culpam os outros. Porque criaram o ficheiro, renomearam o ficheiro, apagaram o ficheiro, recuperaram o ficheiro. Agora não. Não fazem nada com o ficheiro. Nada funciona. O erro persiste. No protetor de ecrã que é o parlamento, saltam janelas que são manchete de jornal. O ficheiro, descobrimos todos, é o governo. E nós somos os idiotas a observar, enquanto um grupo de utilizadores com muitas opiniões mas poucos conhecimentos informáticos, continuam clicar em tudo o que é botão, na tentativa de fazer funcionar o que, obviamente, não tem resolução.

 

Há sempre uma última tentativa. Tentam abrir o ficheiro em modo de segurança. Modo de moção. Mas reaparece o aviso: o ficheiro está corrompido. Sobra a alternativa de sempre: desligar e voltar a ligar. Arrancar da tomada. Cortar a corrente. Recomeçar.

 

Dia 18 de Maio, instalaremos novamente o software e serão criados novos ficheiros. Tomara que não tragam vírus... pensamos... mas é improvável!

 

É que eu ouço falar de um Portugal retrógrado, atrasado, a viver de um passado de glória. Mas temos assistido, cada vez mais, a um cenário diferente. Avançado. Avançado e problemático por isso mesmo. É Portugal a ser o computador com ficheiros corrompidos. Infelizmente operado por uma Velha Senhora que não entende muito das novas tecnologias, mas sabe exatamente como manter a atenção no ecrã, quando é a caixa que está a avariar... e fazer com que todos os outros façam o mesmo...

 

Os ficheiros estão corrompidos. Antes estivessem encravados... como as espingardas de 74.

 

 

Enquanto escrevia este texto o computador abriu uma janelinha negra a perguntar se o Windows podia aceder à minha localização. Tenho de parar de escrever estas coisas antes que enviem a Pide ou um equivalente de nome fofinho (como alguns partidos andam a pedir ao Pai Natal há tanto tempo) para me bater à porta...


Marina Ferraz




Fiquem atentos ao meu Instagram para saberem todas as novidades em primeira mão!




Se quiserem adquirir o meu livro "[A(MOR]TE)"

enviem o vosso pedido para marinaferraz.oficial@gmail.com

quarta-feira, 12 de março de 2025

Moção de Loucura

Imagem gerada por I.A.


Venho por este meio apresentar uma Moção de Loucura.

 

Reconheço, oficialmente, que a Sanidade foi uma das jovens promissoras que emigrou para o estrangeiro à procura de uma vida melhor e sem intenção de retorno. Na sua partida, deixou dentro de fronteiras apenas o já conhecido desespero, a corrupção e alguns laivos de demência, que atingem também (mas não só) a classe política portuguesa.

 

Consciente de que conversas e discursos inflamados já pouco adiantam face à situação atual, e cansada da desordem nacional – tão comum e tradicional como Pastel de Belém e o café com cheirinho – declaro, com a mesma indignação com que o fariam os doutos comentadores políticos dos tascos e cafés, que é hora de rirmos para não chorar.

 

Ressaltando que, de cada vez que o governo cai, quem se aleija é Portugal, espero que esta moção possa ser apoiada pelos que, como eu, estão a ficar roucos de gritar verdades tão ignoradas como os sucessivos líderes governamentais têm ignorado os cidadãos.

 

Mais asseguro que compreendo a inércia dos portugueses no momento de votar e de lutar pelos seus direitos, sabendo que é mais fácil pôr as mãos nos bolsos e assobiar para o lado. Na verdade, até recomendo que sigam de mãos nos bolsos, já que, se não o fizerem, é expectável que alguém tire de lá a pastilha elástica que tem sobrado depois de pagas as contas e acumuladas as dívidas.

 

Aproveito este momento para abordar também uma questão pertinente sobre a queda a pique e os danos provocados ao país, lembrando que antes que sejam curadas as feridas será necessário aguardar, já que as urgências apenas podem ser acedidas após contacto telefónico com o SNS24. Mediante triagem e depois de alguns dias, meses, anos, a desfalecer, talvez o país tenha finalmente consulta de especialidade para iniciar um tratamento que, com sorte, não irá funcionar por erro de diagnóstico. Claro que podemos sempre desejar que o próximo primeiro-ministro tenha menos avenças de casinos e mais avenças de serviços privados de saúde... e que isso, de algum modo, sirva o enfermo país no leito de morte da sua dignidade...

 

 Proponho a presente Moção de Loucura com a intenção de reafirmar a importância do voto e pedir aos portugueses que abracem a essência louca do espírito cívico e cometam a insanidade de levar o cérebro juntamente com o cartão de cidadão, quando forem às urnas.

 

Sem mais,

A pessoa que está aqui a pensar “eu avisei”, mas que não vai dizer isso para não ferir susceptibilidades.


Marina Ferraz




Fiquem atentos ao meu Instagram para saberem todas as novidades em primeira mão!




Se quiserem adquirir o meu livro "[A(MOR]TE)"

enviem o vosso pedido para marinaferraz.oficial@gmail.com

terça-feira, 4 de março de 2025

Cordão umbilical

Imagem retirada da web | Pixabay


Hoje estou vestida de tristeza. Logo eu, imaginem, que sou tão inapta para ser triste, ainda que tenha passado a vida inteira a treinar...

 

A voz da minha mãe interrompeu o sinal de chamada poucos segundos depois de ter clicado no ícone verde do ecrã. Foi casualmente que me cumprimentou. Casualmente, porque a rotina é essa. Porque falamos todos os dias. Porque o cordão umbilical foi mal cortado, e nenhuma das duas quis confessá-lo ao médico. Deixámos que ficasse assim. Ligando-nos, invisivelmente, de uma forma tão profunda que, ainda que tentássemos explicar, não seria entendida. Mas também não queremos explicar... Na nossa fala de meias palavras entendemo-nos plenamente. Um trejeito é uma resposta de três páginas. E a conversa avança depressa, por isso, para coisas menos importantes, já que o importante fica dito no que nem é dito.

 

“Então o Carnaval?”, pergunta-me.

“Um dia igual aos outros...”, respondo. Ouço-a sorrir e não espanto que não se espante.

“Eu também não ligo, mas há pessoas que ligam mesmo muito.” – Breve silêncio. – “Acabo de ouvir numa reportagem pessoas que dizem que é o único dia em que se podem sentir elas próprias...”

 

Sou acometida por um profundo sentimento de tristeza. Há pessoas que dizem que o Carnaval é o único dia em que podem ser quem são, quem sentem que são. Engulo em seco. Sem saber se quero apontar dedos ao mundo que subjuga as pessoas ou às pessoas que se deixam subjugar pelo mundo.

 

“É muito triste...”, digo. Ela concorda.

“É mesmo”.

 

Despedimo-nos. Iguais a nós mesmas. Ela, mulher que já largou a menina que se deixava vergar, mas nunca a convenção aprendida. Eu, mulher que apimentou a menina que já não se deixava vergar, e que se está a cagar para a convenção. Mas, no fim da chamada, eu que raramente me costumo mascarar pelo Carnaval, estava vestida de tristeza. Logo eu, imaginem, que sou tão inapta para ser triste, ainda que tenha passado a vida inteira a treinar para o ser...

 


Tenho a sorte. A honra. (A ousadia?) Essa. De ser eu. De ser quem sinto que sou. Tanto, que não tenho a certeza se o meu eu amanhã será o eu de hoje. Habituei-me a não me negar. Faço sentido para poucos. Sou a miúda dos textos, que às vezes não escreve. A mulher que anda de fato de treino ou de saltos altos. A fadinha. O monstro. A pessoa que treina todos os dias. A sedentária. A pessoa que come saudável. A pessoa que enfarda fritos. Sou, a cada momento, precisamente o que me apetece. (E o médico já me avisou que, provavelmente, vou morrer disso. Altura em que fui a pessoa que o informou que é bom saber, porque toda a gente sabe que morre e poucos sabem de quê...)

 

Por entre o meu eu a ser eu acho que me desabituei da ideia do ajuste. E, de algum modo, foi como se a constatação do óbvio fosse uma novidade muito amarga, que trinquei a seco. As pessoas não sentem que podem ser quem são.

 

É Carnaval. Vestida de tristeza, mergulho em mim para escrever este texto. Nele, crio agora um universo de utopia, onde as pessoas pudessem, todos os dias, ser homem, ou mulher, ou cowboy, ou coelhinha da playboy, ou figura de ação. Principalmente figura de ação, agindo contra o socialmente correto e o politicamente aceitável que lhes rouba a vida.

 

“As pessoas têm medo.” Dizem-me.

 

Eu também tenho. Não do mesmo, obviamente... porque tenho muito medo de só poder ser eu mesma um dia por ano...

 

Sei que não há nada que diga que faça alguém entender.

 

Exceto à minha mãe. A quem não preciso de dizer nada. Porque entende...

 

Calha bem não ter de dizer nada... porque hoje é Carnaval. Estou vestida de tristeza.


Marina Ferraz




Fiquem atentos ao meu Instagram para saberem todas as novidades em primeira mão!




Se quiserem adquirir o meu livro "[A(MOR]TE)"

enviem o vosso pedido para marinaferraz.oficial@gmail.com

terça-feira, 25 de fevereiro de 2025

Pergunta de rasteira

 

Imagem gerada por I.A.

Há uma pergunta de rasteira para escritores. Qualquer entrevista de cinco minutos e lá está ela... Resplandecente. Quais são as suas referências literárias? Pergunta aparentemente simples e que deveria ser de resposta igualmente natural. Só que não é! Nunca é!

 

A pergunta surge. Reviro mentalmente os olhos, tentando fisicamente mantê-los presos no meu interlocutor. Tento não lhe dizer que eu sei que é a pergunta da praxe. Se eu estivesse ali por causa do stand up perguntaria certamente quais os limites do humor. É o bê-á-bá das entrevistas. Parece que, com ou sem curso, todos estudam pela mesma cartilha.

 

A pergunta surge. É também mentalmente que movo com desconforto o corpo inerte. E é mentalmente que estalo os dedos quietos. E, talvez por estar mentalmente a espancar o jornalista, enquanto permaneço tranquila e serena na cadeira, o meu cérebro recusa-se a lembrar-se de referências válidas para apresentar como resposta.

 

É um fenómeno incrível. Li vários clássicos da literatura portuguesa e estrangeira, assim como alguns nomes contemporâneos que certamente ficarão para o cânone. E, naquele momento, o meu pensamento povoa-se de vazio, como se listar alguns autores fosse, de súbito, uma prova de física quântica.

 

Sabendo que a pergunta viria, seria bom ter preparado uma resposta eloquente, mas despretensiosa, que não me fizesse parecer uma idiota iletrada. Mas perdoo-me a falha de acreditar – de todas as santas vezes – que a pessoa que fará as perguntas terá a sanidade e bom senso de não repetir a mesma pergunta que toda a gente faz a toda a gente que escreve.

 

Passam-me pela cabeça, finalmente, alguns nomes que marcaram a minha jornada como leitora. Tento identificar, de entre eles, aqueles que me foram referência. E filosofo durante alguns segundos sobre o que raio querem as pessoas dizer com referência. Querem saber o que eu li? Quem me influenciou? Quem são as fontes de inspiração da minha escrita? Parece simples, mas não é. Porque gostar de um autor e ser influenciado por ele é muito diferente. No rescaldo destes pensamentos, sobra a enumeração do costume.

 

Florbela. Saramago. Pessoa. Eça. Sophia. Penso que poderia estar a fazer a listagem do óbvio, à medida que o menos óbvio começa a sair. Roger Wolfe. Bohumil Hrabal. E sei, no meu âmago, que cada leitura me ajudou a construir o eu que eu sou. Mas não sei se alguma delas influenciou o meu trajeto na escrita. Não sei se estas leituras incentivaram mais a minha escrita do que a mão da minha avó ajudando-me a traçar as primeiras letras, ou do que a paciência da minha mãe que inventava histórias com coelhinhos que andavam, andavam, andavam...

 

Tento explicar isto. Com humildade e despindo-me da temida presunção de nomes que me suplantam: Eu sou fruto das minhas leituras e da minha história de vida. Dos meus encontros. Das minhas perdas. Do meu caminho... A minha literatura também.

 

Há o risinho polido no fim da explicação. A felicidade da vitória com a pergunta de rasteira do costume. Como se colocar-me no lugar de ser eu fosse, de algum modo, uma forma de me baixar a um patamar feito para autores de segunda. Logo eu que sou, como sabe e bem quem segue o meu blog, mais autora de terça, de adega, de quando calha...

 

Sou quem sou e recuso-me a considerar que isso determine o meu valor. Não é isto que digo. Digo antes que me considero uma contadora de histórias. Que cada pessoa é uma história. Que toda a gente me inspira. Que gosto de romancear a vida, de a ficcionar...

 

Olha-me, condescendente e diz:  A Marina é a Marina. Essa é que é essa...

 

Sorrio. Ainda bem que não me sabe humorista, porque literalmente não me interessa qual o limite do humor... Respondo:

 

É! Eça é que é Eça! Eu certamente não escreverei “Os Maias”!..


Marina Ferraz




Fiquem atentos ao meu Instagram para saberem todas as novidades em primeira mão!




Se quiserem adquirir o meu livro "[A(MOR]TE)"

enviem o vosso pedido para marinaferraz.oficial@gmail.com