terça-feira, 11 de setembro de 2018

Debaixo dos filtros




Debaixo dos filtros e da maquilhagem existe uma pessoa. Fundamentalmente igual a todas as outras pessoas, que têm borbulhas e cicatrizes e manchas na pele. Peço desculpa. Não acordo maquilhada e com filtros. Ainda que deles faça uso.

Não faço uso deles porque quero que me julguem perfeita. E por isso admito: Debaixo das tintas há pele. Debaixo da roupa há nudez. E não tenho medo delas. Mas também não tenho medo das roupas, dos filtros, da maquilhagem.

Não acho que me reduza a forma do meu corpo sem push-ups. Não acho que me reduzam as manchas e as olheiras na pele sem tintas. Mas também não acho que o seu uso me reduza, que me embruteça, que me torne mais insípida ou superficial.

Passei uma vida a ser mulher entre as noções do que uma mulher deve ser. E anos no seio elitista da noção que nega à mulher o direito de se enquadrar nas noções do que a sociedade diz que a mulher deve ser.

E cansa-me. Cansa-me que não possa estar natural para ser mulher. Cansa-me que não possa estar maquilhada para ser feminista.

Não quero cair nos erros fartos do mundo.
Maquilho-me… se me apetecer. E não me maquilho… se não me apetecer. E tiro selfies. E uso filtros. Se e sempre que me parecer bem.

Recuso-me a ser livre só no papel que diz que o sou. A liberdade não é um contrato que nos vincula a um espaço de prisão a céu aberto, com paredes de crítica e de opinião alheia.

Debaixo dos filtros e da maquilhagem, existe uma pessoa. Também acordo com olheiras. E sardas do sol. Se queres mergulhar na minha imperfeição, onde o nado é livre, pára de ficar sem fôlego na camada superficial das minhas fotos das redes sociais.

E não! Não vou deixar de sorrir para a lente da frente do telemóvel, procurando o meu melhor ângulo. Nem vou deixar de editar essa fotografia. A menos que queira.

Porque não devo a mim mesma nada senão a liberdade. E escolho a ambiguidade de amar o rosto que me reconhece pela manhã e aquele que pinto. Escolho levar o segundo à rua, sem medo que ele anule o primeiro.

Eu sei que não sou perfeita! Nem excessivamente bonita. E sei que não tenho a pele que as bases e os filtros entoam. Mas não me importo!

Acontece que me amo. Amo o meu eu de pijama e pé encardido no chão. E o meu eu de salto alto e três camadas de tinta.

Não engano ninguém nas fotografias. Simplesmente, sou mais do que elas. Tenho mais na vida do que o momento estático das fotos de modelo. Como pensar, questionar, rir. Acima de tudo rir. Rir da ideia de que não devia tirar fotografias porque me faz parecer superficial. Rir da ideia de que não devia maquilhar-me porque me faz parecer burra. Rir da ideia de que não devia falar do meu eu natural porque tiro fotos e me maquilho.

Apresento esta ideia:
Não me limito e não me reduzo.

Debaixo dos filtros e da maquilhagem, tal como sobre eles, existo eu! E sim, eu devia fazer tudo isso. O que eu não devia fazer é ouvir comentários de pessoas que escolhem um rótulo só e o levam para a cova, feito bandeira.

Eu levo os meus mil rótulos. Em caso de dúvida, escrevam na minha morada final, talhando a pedra da lápide com rudeza: “ninguém entendeu, mas viveu em paz.”.





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