quarta-feira, 7 de agosto de 2019

Espero




Eu espero. E vou dizendo que espero por amor. Enquanto me dizem. Que não espere. Mas eu espero. Porque é isso que faz quem ama. Espera.

Em alguns dias, espero que, pela manhã, o sol nasça sem nuvens à tua porta. Espero que alguém te leve o café à cama, com um beijo e um poema nos lábios. Espero que, com ternura, novamente se enfie na tua cama e se recoste no teu abraço, caso queiras sentir o calor de outra pele. Espero que o café não seja acre. E que os gatos saltem para a cama e façam caretas no aroma cafeinado de um dia que te comece feliz.

Espero.

Em alguns dias, espero que as ruguinhas que te surgem junto aos olhos sejam estradas de sorrisos feitos ao longo dos tic-tacs dos relógios. E espero que te esqueças. Das rugas e dos relógios. Para seres menino e feliz e eterno. E espero que esse lado mais inocente de bebé crescido se note no fundo do brilho dos olhos que te refletem vidas. Mas só espero que se note porque espero encontrar, também para mim, algum alento.

Espero.

Há tardes em que espero que o trabalho não te engula mas te sustente. Assim. Espero que possas, folgadamente, deixar os passos marcar areias, deixando quatro pegadas. Porque espero – espero – que não conheças uma solidão igual a minha. E espero. Que os passos impressos na areia te levem para uma casa que seja um lar (como eu não tenho) ou para uns braços (como eu não quero) para acentuarem mais e mais essas ruguinhas que se formam na moldura dos teus olhos.

Espero.

Dizem-me que não espere.

Mas espero.

Espero que a noite venha lenta. Que o pôr-do-sol tenha a cor de uma fotografia com mil reações, espelhadas através do mundo pelo ecrã digital. E espero que os teus dedos, nessa subtileza desligada, acariciem, por vezes, com um toque de carinho, a memória de um eu que se expõe e se despe. Sempre mais em palavras. Mas também em roupas.

Espero. Em alguns dias, verdadeiramente espero, que tenhas a sorte de um amor maior do que o meu, embora não saiba se existe. Que tenhas a felicidade que eu não dei. Que tenhas quem te apoie nas quedas, porque na subida é tudo mais simples. E espero. Espero que tenhas quem te coloque na montanha russa que odeias para poderes ir mais longe do que os teus limites e ser mais do que compromisso rotineiro com a ideia da loucura.

Espero. Todos os dias espero. Que estejas bem. Mas, claro. Não sou a melhor pessoa do mundo. Como não sou a melhor pessoa do mundo - facto incontornavelmente repetido, até ao limite da sanidade e, de tantas vezes ressaltado, tornado real – eu espero. Às vezes espero que se cale a voz em mim. Essa que diz que espero que te vás foder. É uma voz que tem alguns ressentimentos. Desculpa. Pelas mentiras (que podiam ser evitadas). Pela distância (que nasceu numa mentira). Pelo silêncio (que nasceu numa distância). Pela crença de que a melhor pessoa do mundo não me deixaria à espera, por entre paredes que ecoam versos que nunca foram escritos.

Não o nego. Às vezes espero esquecer. Um dia. Talvez amanhã. Espero pelo dia em que não espere que sejas mais feliz do que eu. Espero pelo dia em que o meu coração perca um batimento e outro a seguir e outro depois. Espero por dormir. Espero.

Eu espero. E vou dizendo que espero por amor. E, quanto me dizem que não espere, eu digo que, quem ama, não pode fazer outra coisa.

Eu espero. Espero muito. Tanto que até espero que não leias este texto. Para não saberes. Que eu espero.






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