terça-feira, 13 de junho de 2023

Tudo o que sei sobre a vida

 


A pergunta, com algum sarcasmo, com algum escárnio, com alguma razão: mas que raio sabes tu sobre a vida? É um facto! Não sei muita coisa. 33 anos não chegam para saber muita coisa...

 


Nascemos e começamos a morrer. É isto que eu sei sobre a vida. As pessoas acham que nascemos e começamos a viver. Eu acho que viver, vivemos sempre. Nem toda a existência é humana. Mas quando o corpo miúdo rasga as entranhas das mulheres-herói que nos transportam no ventre, é para que inspiremos o ar, expulsando o mar dos pulmões, e comecemos a morrer, gota a gota.

 

Havemos de nos sentar em bancos de jardim e de andar de bicicleta por cidades povoadas de segredos. Havemos de dançar as danças infinitas de quem quer que o abraço chegue – como diz o Rui – até aos ossos. Encontraremos quem, dançando, nos entra no tutano. Ainda bem! Porque é aí que conheceremos o exclusivo tempo verbal do verbo gasto e o usaremos, de facto, mesmo que num silêncio pacato e nosso. Vestindo esse verbo que é peça de tamanho único, aprenderemos a olhar os dedos apontados das crianças para novidade do mundo, lembrando com saudade o tempo em que os olhos não tinham lentes-de-história-e-passado. Vestindo esse verbo, beijaremos a areia e inclinaremos o mar. Carregaremos, sobre os ombros, gente em vez de fardos.

 

O digital quer-nos fazer crer que a vida cabe em quadradinhos. Retangulozinhos. Mas a verdade é que é feita de círculos. A minha amiga Vanessa diz que foi num “círculo que encontrou um canto”. Eu encontro todos os meus cantos em círculos e gosto muito desta frase, em parte porque é genial... mas também por vir justamente de alguém que está no meu círculo e que me faz amar um bocadinho mais as dinâmicas circulares do mundo. Mas tudo o que não é círculo, é ciclo. E seguimos, repetindo padrões. Uns melhores. Outros piores. Lutando. Dando. Recebendo. Surgindo de quase nada e indo para o quase-nada que se dará à terra, sem nunca sermos outra coisa que não a “poeira de estrelas” que Sagan cantou no seu poema-ciência.

 

  Nascemos e começamos a morrer. Nesse caminho para a morte, se tivermos muita sorte, entenderemos que morrer é justamente o que dá valor à estrada e a todas as ervas que crescem na orla dos caminhos. Esse é o conhecimento que pesa no corpo. A aprendizagem que nos leva, da corrida infantil até à calma dos passos ponderados, apoiados na bengala, porque dois pés já não chegam para nos prender ao chão. Pesada, ela verga-nos o corpo em reverência, no entendimento de que a Natureza é mãe. Vamos baixando aos poucos, antes da hora de deitar e descansar no seu embalo. Parte intrínseca desse todo que é tudo.

 

Não sei muita coisa. 33 anos não chegam para saber muita coisa. 34, tão perto, também não vão chegar. Mas à pergunta - que raio sabes tu sobre a vida? – sinto que o desconhecido se consubstancia no verbo que não gastei, mas que me modela. Sei sobre a vida que há o círculo. E que ele importa. Que há o espaço dos outros. E ele importa. Que há lutas necessárias. E elas importam. Que há quem escolha andar connosco. E isso importa. Que vou morrer. E isso importa mais.

 

Que raio sei eu da vida?

 

Tão, tão pouco! E – talvez – tudo o que preciso de saber!


  Marina Ferraz




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