“O homem que planta árvores,
sabendo que nunca se sentará à sombra delas,
começou a entender o significado da vida.”
(Rabindranath Tagore)
Se a árvore tombada escrevesse um sonho antigo, diria, talvez - rebento ainda a estender as primeiras folhas com a preguiça, para expulsar os grãos de terra - que um dia sairia da sombra anciã das árvores grandes. No chão, moribunda, tem agora o mesmo tamanho dos rebentos que lhe escutam a história.
Da sombra cada vez maior da minha história – haveria de dizer – tinham nascido outras estórias. Algumas de amor, outras inusitadas e de guerra fria. Mas focaria as estórias de amor. Essas – diria – e só essas, valeram o tempo das flores e dos frutos. Ciclos inevitáveis de um caos muito humano, expressão do belo e arquitetas do futuro do mundo. Dignas de menção. E só.
Todo o humano ama a sombra. Diria a árvore caída aos brotos. Quando o tempo aquece, todo o humano ama a sombra. Mas o tempo muda. E a vontade segue esse tempo. E o caos do amor é ódio, por vezes, amenizado pelas máscaras. Isto, não diria já, para não assustar as crias da terra. Acrescentaria antes: todo o humano ama a sombra e todo o humano a teme.
Abençoaria os esforços dos pequenos rebentos com um suspiro. O vento entoaria esse sopro de madeira, removendo os últimos grãos das primeiras folhas das futuras árvores. E pensaria, triste mas silenciosamente: que tenham futuro e venham a sê-lo...
E o broto mais pequeno perguntaria: como se pode amar o que se teme? E a árvore tombada lembraria o egoísmo e a inveja. O desejo humano de que o outro não cresça, não vá ele ser obrigado, subitamente, a viver na sombra do sucesso alheio. Mas não o diz. Esboça um sorriso ténue no ranger da madeira velha. Frequentemente amor e medo juntam-se na mesma canção. Entenderás ao crescer. Amarás as tempestades que te regam e temerás que te destruam. Amarás o verão e temerás a seca. Amarás os homens e temerás o seu machado. Suspira. Deves temer o seu machado.
Em tempos, fora uma árvore num caminho. Sombra. Agora, árvore fora do caminho. Sobra.
Nada mais disse aos rebentos. Adormeceu. Se a árvore tombada escrevesse um sonho antigo, diria, talvez, que preferia os homens que entendiam o sentido da vida do que aqueles que, claramente, tinham somente sentido na morte e machados e serras e desapego...
O seu silêncio foi marcado com as lágrimas muito secas de um verão escaldante. Os caminhos desertos evitavam-se e as sombras eram abrigo divino de quem se aventurava nas ruas.
Como não servia para nada, foi cortada em pedaços e esquecida.
Viriam dias frios, e o calor seria também esquecido. Viriam dias frios nos quais se arrancariam brotos, feito ervas daninhas. Viriam dias frios, em que se cortariam árvores para alimentar lareiras.
Se a árvore tombada falasse e os rebentos tivessem sobrevivido, haveria de lhes dizer que o problema era esse. As pessoas esquecem com facilidade que amam a sombra, quando já não precisam dela...
Toda a gente gosta da sombra. Mas poucos o lembram.
Desmatamento. Incêndios. Destruição.
Toda a gente gosta da sombra.
Que triste será o Verão dos nossos netos...
Se a árvore tombada falasse, penso que concordaria...
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