Querido Pai Natal,
Eu queria escrever-te uma carta. Aposto que recebes muitas e
que a minha será apenas mais uma sobre um monte infinito de outras, quase todas
mais importantes e com pedidos mais urgentes. Mas peço-te que leias a minha
primeiro. Preciso que a leias e que a faças seguir por aí. Porque só tenho um
pedido. Apenas um.
Não me falta nada. Nunca faltou. Em criança, tive todas as
prendas de que precisava e o meu quarto encheu-se de brinquedos. Com muitos
deles, nem cheguei a brincar. Fui uma criança doente mas amada. Nunca me faltou
quem me levasse ao médico, nunca me faltaram medicamentos, nunca me faltou,
sequer, o amor e carinho de mil entes queridos. Fui muito afagada, muito
cuidada, muito amada.
Sobre a mesa, fosse Natal ou não, houve sempre comida em
abundância. Nunca passei fome, nunca passei frio, nunca me senti desamparada.
E, mesmo assim, todos os anos te escrevi, pedindo coisas que não precisava, na
esperança de encontrar no sapatinho, sob a árvore de Natal, um sem fim de
extravagâncias tolas. Mas a minha família amava-me. Amava-me tanto que me
oferecia, não apenas o necessário mas também esse supérfluo que me enchia o
sapatinho de embrulhos perfeitos e coloridos. E, por isso, das coisas que te
pedia nessas cartas, cheguei a ter quase todas.
Foi com o tempo que comecei a escrever mais e a escrever-te
menos. Deixei de acreditar em ti bastante cedo, embora me tenham feito fingir
que te acreditava até tarde. E eu fingia, por eles, porque era importante para
eles que eu julgasse que, voando sobre os telhados, espalhavas prendas e
alegria pelo mundo. Mas deixei de acreditar em ti cedo, quando os supermercados
começaram a vender, não apenas as prendas mas também uma imagem de ti que não
me fazia sentido, enquanto os telejornais espalhavam imagens de guerra, de
miséria, de fome pelo mundo.
Não fui uma criança informada. Como quase todas, ignorava
muito do que via. Mas, de alguma forma, olhava para o mundo com olhos críticos.
E esse olhar fez com que de criança a jovem e de jovem a mulher, soubesse
sempre que andava de mãos dadas com a sorte.
Nunca me faltou nada. Não me falta nada. Tenho família,
amigos, um amor forte e persistente que me faz lutar pelo melhor de mim. E
tenho estudos, tenho cultura, tenho mais livros nas prateleiras do que algumas
bibliotecas. Tenho um sonho, tenho pessoas a apoiarem-me nesse sonho.
Nunca me faltou nada e continua a não me faltar coisa
alguma. Mas pedi-te que lesses esta carta primeiro. Pedi-te que o fizesses
porque preciso que compreendas que, quem te escreve, como eu te escrevia,
muitas vezes tem uma vida de ouro nas mãos e a ilusão da necessidade. E, se
calhar, não é importante que distribuas por aí brinquedos caros e instrumentos
tecnológicos de última geração.
Este ano, mais de quinze anos depois de ter deixado de te
incomodar com pedidos, envio-te esta carta. E preciso que a leias e que a faças
seguir por aí com o único pedido que posso conceber fazer-te. E esse pedido é
simples: oferece amor a quem está infeliz, conforto a quem não tem lar, comida
a quem passa fome e agasalhos a quem passa frio. Oferece um abraço a quem está
só e uma palavra a quem está triste. Oferece um futuro a quem está preso ao
passado, uma oportunidade a quem está desesperado, um sonho a quem vive sem
esperança. E, se está nas tuas mãos a possibilidade de ofertar tudo isto,
peço-te que o faças o ano inteiro e não apenas no Natal.
Eu fui uma criança com sorte. Nunca me faltou nada. Mas, no
mundo, há gente a quem falta quase tudo. Por isso, este ano, o meu pedido é
para ti, sim, mas não só. Peço-te que leves esta carta a quem, como eu, teve
tudo. Peço que a espalhes por aí e que faças com que ela seja lida e relida por
aqueles que têm o poder para fazer a diferença. E peço-te que, este ano, quando
conduzires o teu trenó sobre o mundo, espalhes um pouco de consciência e
solidariedade sobre este meio de consumo onde se enfatiza cada vez mais o
egoísmo e a cegueira.
Talvez esta seja a última carta que escrevo. Espero que não
te importes. Não é por mal. É apenas porque não há mais nada a pedir e não
quero que a minha carta, repetitiva e insistente, te desvie a atenção das
milhares restantes, onde mais pessoas cheias de sorte te hão-de pedir coisas
das quais não precisam, apenas porque é Natal...
Com os melhores cumprimentos,
Marina Ferraz
*Imagem retirada da Internet
Um texto dos mais perfeitos desse ano,é uma lição que deveria ser aprendida,nunca acreditei em Papai Noel,é verdade,também nunca pedi presente de Natal,mas se todas as crianças e não só elas comos os adultos também,que pedissem superfluos se unissem para pedir ajuda a quem precisa,nosso mundo seria melhor.
ResponderEliminarÉ incrível,maginifico.
Parabéns querida,feliz Natal
Beijinhos Jenny ♥
disseste para espalhar esse ponto de visão para o mundo ,e eu quero ser uma pedra dessa expanção e da mudança que ira se seguir e tambem pelo aumento do egoismo e desperdicio mental dos seres humanos . Até mais Marina .
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