Foi sempre assim. Metade. Como se não houvesse forma de ser
maior. Melhor. Completo. Foi sempre metade. Solidão acompanhada. Vitórias
perdidas. Momentos entregues ao ar, para se dissiparem juntamente com a
sensação de que nada estava certo. Metade.
Foi sempre assim. Olhar ao espelho e ver o corpo sem a alma.
Estar triste e sentir uma alma sem corpo. Estar magoada e saber o coração sem
vontade. Metades das metades de mim, divididas aos poucos, até não serem mais
do que grãos de poeira a esvoaçarem pelo céu da minha vida, ocultando-me o sol
da felicidade.
Nunca conheci outra coisa. Apenas metade. Metade da vida.
Metade do contentamento. Metade da realização. Metade das metades sem fim que
se acumulavam em nadas, em vazios, numa sensação eterna de que metade da vida
era um caminho para a morte que tardava.
Foi sempre assim. Metade. Parcelas indefinidas de mim que
não eram eu. Sonhos empilhados em poemas, que se somaram em livros e se
empilharam em estantes onde metade dos sentimentos eram meia mentira. E metade
dos sonhos ficaram esquecidos nas meias mentiras onde meias verdades dançavam
valsas sem par.
Sem conhecer outra coisa, habituei-me ao espelho que me
mostrava metade de mim. Habituei-me a ver metade do meu rosto chorando metade
das lágrimas que me inundavam a alma e a sorrir meios sorrisos quando me
cruzava com gente no meio da rua.
E metade dos sentidos ficaram presos nas metades
indivisíveis do que nunca foi completo. Sem que houvesse mais do que cicatrizes
na metade mais frágil da minha pele onde se cumpriu metade de uma profecia que
fazia meias promessas de uma eternidade oca.
Foi sempre assim. Metade. Metade amor. Metade vazio. Metade
alegria. Metade tristeza. Metade sorriso. Metade lágrima. Metade indolência.
Metade euforia. E as metades somavam-se em mais e mais metades de vazio, que
eram metade eco, metade vontade, metade de nada.
E eu caminhei, em meios passos por meias ruas onde pessoas
às metades olhavam para mim e me viam inteira, como se eu pudesse sê-lo. E
rasgava-se em mim a vontade da vida que seguia, andando de metade em metade,
tentando emendar com costuras largas e mal feitas os espaços vagos das metades
que sobravam e das que não havia em mim.
Andei pelos trilhos mais negros do que ficava no mais fundo.
Procurei as metades certas que se uniam às minhas metades e me podiam tornar
alguém com um principio, meio e fim. Procurei as metades que me dariam coerência,
sorriso, felicidade. E cansei-me de olhar para dentro das minhas metades de
vazio onde já não parecia haver metade de nada que valesse a pena.
Foi sempre assim. Metade. Como se não houvesse forma de ser
maior. Melhor. Completo. Foi sempre metade. Solidão acompanhada. Vitórias
perdidas. Momentos entregues ao ar, para se dissiparem juntamente com a
sensação de que nada estava certo. Metade. Foi sempre assim. Sempre. Até eu
descobrir, nos confins do meu coração, que és a metade que me faltava.
Marina Ferraz
*Imagem retirada da Internet
amei profundo muito profundo...
ResponderEliminarNesse texto como em todos os seus,conseguiu mostrar e ilustrar o que as pessoas,assim como eu,sentem.Cada palavra que diz "Esse texto é para mim" e é por isso que te tornas tão boa no que fazes.
ResponderEliminarAmei de coração.Saudades minha querida,parabéns.
Beijinhos Jenny ♥
Metades que parecem tão poucas não é.Ótimo texto,tenho gosto,muitos parabéns.
ResponderEliminarO meu favorito desse ano *--*
ResponderEliminarParabéns
Paola
Gostei muito desse texto,ele é especial e você escreve muito bem sempre. :D
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