Tu eras muitas coisas. Mas não eras cruel. Fazias-me chorar.
Odiavas-me o choro. Tentavas fazer-me rir. Nem sempre conseguias. Mas tentavas
sempre. Nunca te encostaste na ombreira das coisas simples, pronto a desistir
da minha felicidade. Meu amor, tu eras muitas coisas. Mas não eras cruel.
Tu eras muitas coisas. Eras, talvez, dono da honestidade
mais crua que algum dia conheci. Dizias a verdade dura, a verdade
inconveniente, a verdade que despertava o medo no centro dos corações puros e
impuros. Dizias o que pensavas. Mas tentavas sempre que, ao dizê-lo, passassem
pelas tuas palavras os traços brancos da verdade e não os seus espinhos. Meu
amor, tu eras muitas coisas. Mas não eras cruel.
Tu eras muitas coisas. Em alguns dias, eras o herói que
desafiava os ventos. Noutros, o monstro que tentava mudar-lhes a direcção.
Vi-te bateres-te contra o destino. E ouvi-te despejar palavras indecorosas e
obscenidades nessa eterna luta contra o imprevisto. Mas nunca, nem por uma vez,
te vi fazê-lo a outra pessoa, como se culpasses os outros pelo que de pior te
estava fadado. Meu amor, tu eras muitas coisas. Mas não eras cruel.
Tu eras muitas coisas. Vi-te cair. Vi-te levantar. Vi-te no
teu melhor e no teu pior. Descobri, por entre os meandros de ti, lugares
negados aos outros e repletos de inconformidades presentes. Das quedas, vi-te
as cicatrizes. Descobri a profundidade delas num vislumbre tosco da tua alma.
Soube sempre que a vida te tinha ferido de uma forma mais densa do que o
sorriso do rosto deixa adivinhar. E julguei sempre que, num momento ou outro, a
frieza do mundo se espelharia em ti. Mas não. Meu amor, tu eras muitas coisas.
Mas não eras cruel.
Meu amor. Cansaste-te de ser muitas coisas. Quiseste ser
apenas tu. Tu sem mim. Somente tu. Gritaste coisas sem nexo. Quebraste-me o chão.
Foste. Eu fiquei. Fiquei no chão quebrado. Aos meus olhos pareceu-me que, a
cada passo, distorcias uma imagem de ti. E questionei quem era este homem que
me abandonava, na certeza de que ele não podia ser o mesmo que amei.
Continuo à procura de uma razão... não te reduzo os passos ao egoísmo nem ao
desapego. Não sei quem és. Sei quem eras. E eras muitas coisas... Mas, meu
amor, não eras cruel.
Marina Ferraz
*Imagem retirada da Internet
Esse texto é como a descrição de um personagem que acabei de ler um livro,por mais duras que fossem as palavras,os gestos,nunca era cruel,nunca foi,nunca será.
ResponderEliminarAdorei :D
Beijinhos ^.^