Marcaste-me na tua pele. Da primeira vez que me pegaste ao
colo. Marcaste-me. Na tua pele. Como um corte sem dor, que deixaria uma
cicatriz impressa na alma, ditando-nos, nos gestos, mais palavras do que as que
se armazenam em dicionários e enciclopédias.
Em mil (pre)dispostos de carinho, foste acomodando pedaços
meus em ti, aceitando uns com a simplicidade da vida. Discutindo outros, para
que eu acautelasse os traços de tudo o que tu vias que poderia ver a ser
impeditivo de um amanhã. E, entre aceitação e dúvida, caminhaste comigo. E
fizeste-me. Todos os dias. Parte. De ti. Marcaste-me. Na tua pele.
Chovesse ou fizesse sol. Nas tempestades da vida. E nas
vagas de indiscutível quentura. Concordasses ou não com os meus passos.
Seguisses já, ou não, pelas minhas pedras. Vieste. E, vindo, trazias a muralha
nos teus braços, que envolvias em meu redor. Protegias-me de tudo o que viesse.
De tudo o que pudesse eventualmente vir. E eram palavras. E eram gestos. E eras
toda carinho. Enquanto o fazias. Enquanto me marcavas. Na tua pele.
Houve sempre ternura nos teus gestos, quaisquer que eles
fossem. E sabedoria nas tuas palavras. E carinho nas tuas mãos. E aconchego no
teu olhar que se lançava, meio aguado, meio choroso, sobre vitórias e
despedidas breves. Caía-te do olhar, pura como a tua alma, uma gota de
esperança que me fazia também escrava da saudade precoce, estando ainda junto a
ti. A olhar para ti. Vendo-me menina. Vendo-me mulher. Vendo-me como ninguém me
vê. Marcando-me. Na tua pele.
E nas estruturas. Edificadas beijo a beijo. Sonhadas dia
após dia. Lá fomos. Sendo. Tu e eu. Mais do que tu. Mais do que eu. Um nós
perpétuo, que se vinca na pele e se vincula na terra até ser raiz. E eu? Indo.
E tu? Caminhando ao meu lado, real ou ideologicamente. Mas sem nunca resistires
ao ímpeto de me acompanhares na jornada. Porque também sabias. Que o tinhas
feito. Que me tinhas marcado. Na tua pele.
E, à medida que me marcavas. Na tua pele. Na pele da tua
alma. Na pele do teu coração e nas células que o constituem. À medida que me
tornavas eternamente parte do que ninguém rouba. Eternamente tua. Eternamente
criança. Também eu o fiz. Marcava-te. Na minha alma. No meu coração. Na minha
pele.
Um dia, olhando ao espelho. Incomodou-me ter-te tão
profundamente em mim. Escondida. Como se fosses segredo. Nos meandros do que
não se vê. Incomodou-me ter-te marcada em mim sem que ninguém o soubesse. Sem
que ninguém o visse. Quis que o mundo pudesse ver-te em mim. Roubei-te a
caligrafia e a palavra que me disseste mil vezes. Marquei-te na minha pele. E
agora o mundo vai poder ver-te em mim. Enquanto eu caminhar sobre o mundo.
Nesse tempo de eternidade humana que é breve, tão breve, tão mais breve do que
o meu amor por ti…
Marina Ferraz
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