Havia uma história. E a história não era verdade. E a história não era ficção. A história vivia entre conceitos, provavelmente entre um e o outro, porque a vida é isso. Descoberta e discussão. Mutável, como a boa ciência. Com direito ao contraditório, como o bom jornalismo. Mas o ser humano habituou-se. Ao estereótipo simplista e redutor. É mais fácil.
Ou é verdade ou é mentira. Não há espaço para o que fica de permeio. Não há espaço para a conversa, para o debate, para o assumir da fragilidade humana das verdades mutáveis. Há pouco espaço. Nas mentes das pessoas. Para perceber. Isso. Que as verdades universais são dogma... Que as verdades absolutas não são verdade.
Pede-se uma epifania. Para a mesa do canto. Sirvam em dose dupla, por
favor.
Perceber implica questionar. Aceitar é outra coisa. É um saber que se sabe o que não se sabe, nem se quer saber. Toda a luz nasceu de experimentação e da falha. Do questionamento. Toda a esperança depende do ponto de interrogação no final das frases. E da troca de ideias que se faz. Da conversa. Do debate. Da contradição. Do embate. Da resistência.
Mas é mais fácil vergar. Foi sempre mais fácil vergar. Obedecer custa menos do que lutar, assim como o silêncio custa menos do que as palavras. É uma apatia temperada a medo que leva filas e filas de autómatos da vida até à morte, sem viver de facto.
Pede-se uma epifania. Para a mesa do canto. Sirvam em dose dupla, por
favor.
Custa-me olhar. Para os campos, para as trincheiras. Para os dois lados de uma guerra sem causa nem motivo. Para o rasgar da carne e das partilhas. Para a criação de facções, quando todos somos gente. Quando todos somos pessoa. Quando todos estamos a tentar. O mesmo. Sem dúvida. Ser felizes.
O inimigo público é o medo. E a aceitação acrítica é a droga. Vejo, pelos cantos e pelas ruas, todos os junkies indolentes, impassíveis, agindo em espelho face aos demais. E penso. Sempre o mesmo.
Pede-se uma epifania. Para a mesa do canto. Sirvam em dose dupla, por
favor.
Avanço. Nas mesmas ruas onde se vendem máscaras e corpos. Procurassem as pessoas a paz como procuram a segurança. Procurassem as pessoas a clareza como procuram o prazer.
Pede-se uma epifania.
Penso vender a ideia, com uma publicidade apelativa. Assim: Uma epifania é um orgasmo mental. Mas ninguém quer uma epifania. A apatia é mais segura. A obediência é mais consensual.
Uma epifania é um orgasmo mental. Talvez o problema do mundo seja falta de sexo...
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