É volátil. E algo fútil. E totalmente despropositado. Como
crianças de infantário, que tendo acesso a trinta bolas azuis, querem sempre
aquela que o amiguinho tem na mão. Talvez porque já tenha da sua saliva e das
suas impressões digitais. Ou talvez porque dê prazer que o amiguinho não tenha
aquela bola azul. Ou, quem sabe, porque o apelo não esteja na bola azul mas nas
mãos que a seguram. Lançada ao ar, caindo no centro de todas as bolas azuis,
talvez nem se saiba qual era aquela que nos despertava desejo. Ou talvez se
saiba, mas já será apenas uma bola, sem nenhum traço de apelo. Acontece. Quando
é volátil. E fútil. E totalmente despropositado.
Quando as bolas azuis são olhos e têm partilhas sociais;
acompanhadas de uma enunciação do mundo perfeito, da realidade perfeita, do
emprego perfeito, do dia perfeito… há um apelo mudo na figura estática e na
partilha das palavras. Impele. Apetece. Como um fruto de verão, acabado de
arrancar da árvore, fique ferido o ramo que a sustenta ou não.
Toda a gente tem a mais elevada moral. Que se esgota e cuja
quebra se justifica na ambiguidade do “tudo por amor”. Mas que amor? Como é
fácil amar o que não existe. O que não se conhece. O que não se sabe. É nas
lacunas, onde mora só o desconhecido, que se constroem esses amores. Voláteis e
fúteis. E despropositados. Com um toque de criança de infantário, que quer
aquela bola azul porque sabe que a outra criança a tem.
As melhores pessoas do mundo são as que conhecemos mal. E há
uma paixão que é fogo nesse desconhecido. Mas no mergulho em profundidade até
ao negro mais escuro de todos os negros da alma, aí reside o amor. Conhecer
alguém na debilidade de todos os seus defeitos e sentir um fogo de lareira
acesa, alimentada a óleos caros e lenha de pinho, sem fazer contas aos gastos.
E há quem seja. Volátil. Fútil. Totalmente despropositado.
Há quem queira uma bola azul que é uma pessoa nas mãos de outra pessoa que,
sabe-se lá se não foi ao inferno e voltou. Mas, no conhecimento, algo ambíguo e
incompleto, de uma história que é metade da metade da metade que a constrói,
parece que o mundo não só é plano, como inclinado para o lado da figura de
afeto onde se soma, não a perfeição da perfeição mas a perfeição do
desconhecido.
Estima-se que, neste momento, existam, no mundo, 101,8 homens
para cada 100 mulheres. Certo que uma percentagem deles serão homossexuais. Mas
uma percentagem delas também o será. O que significa, em grosso modo, que
existe, por aí, um homem para estas pessoas que insistem na bola azul que já
tem mãos em seu redor. Para elas. As amigas.
E, embora seja volátil, fútil, despropositado, há três
corações. Quatro. Cinco. Porque se pensa sempre que são casos isolados e nunca
são. Batem mil corações na mesma tristeza. E ela também não faz sentido nenhum.
Porque se sofre de um mal que não é.
Palavras são só palavras. Faço uso delas. Às vezes como
armas. Não sou perfeita. Nunca vou ser perfeita. Mas sou o corpo que se envolve
no fim da noite. E o café pela manhã. E o primeiro passo de ajuda na
dificuldade. Moderadora de dores. Agente da tomada de decisões e, às vezes,
carrasco de força onde só há debilidade. Propostas são só propostas. Palavras
são só palavras. E, tirando as que eu digo (ou escrevo), não dizem nada de mim.
Dizem muito de quem as esparrama, preto no branco. Dizem muito sobre o que a
amizade não é. Nem o amor. Dizem muito sobre ser-se volátil. E fútil. E
despropositada.
Marina Ferraz
*Imagem retirada da Internet
Sigam também o meu instagram, aqui.
Sem comentários:
Enviar um comentário