Para a minha avó
Batem as nove. Bate a saudade. Bate o desejo de ouvir a tua
voz. Um bater incompreensível de ideias. Esbatidas mas constantes. No bater do
ponteiro dos minutos e das horas. No bater das nove.
Bate o cansaço. E a vontade de saber que estás bem. Bate o coração.
Compassado. Descompassado. Cheio de amor. Batem, no bater das nove.
Bate à porta a noite que se queda. E cai, com ela, um sol
que me é destino e passagem, no nascer da lua. Conforta-me a ideia da lua, que
é a mesma na distância entre nós, e nos faz presença. Quando bate. A saudade.
Pelas nove.
Batem as nove. Bate a saudade. Bate o desejo de ouvir a tua
voz. Já se faz noite. Já se faz hora. Toca o sinal da recolha. Toca uma música
na rádio. Toca o sino na distância. A anunciar. O toque do amor. Que ecoa nas
entrelinhas do nosso encantamento. Que ecoa na vontade da troca de palavras.
Batem as nove. Toca o sino. E o telefone também.
Toca o telefone. Nele, a tua voz traz o bater do carinho,
feito aconchego. As tuas palavras são cobertores bem puxados junto às orelhas e
camas preparadas com cautela. E, na tua voz, toca-me, com um saudosismo
inerente, a mão que me afaga a vida e me dá alento para suportar a noite que
queda e o dia que vem a seguir. Toca o telefone e tocas-me, com as pontas dos
dedos da voz. Há traços de canto na melodia das palavras que me dedicas. Todas
as noites. No bater das nove.
Uma canção de embalar. Vem em forma de rotina. No bater das
nove. No toque do telefone. Todos os dias. Quando me bate a saudade. E me
acautelas o medo dos mostrengos que se escondem nas sombras do meu
desassossego. Há amor na tua voz. E ele é luz. E não há sombras quando falas
comigo.
Batem as nove. Bate a saudade. Tocas-me na distância da
chamada. E ficas perto. Até que o calor do abraço pensado se faz gente e me envolve,
mesmo longe. Há um calor que me adentra. Vem de ti. No bater das nove. E fica a
rondar, noite fora, abençoando-me as madrugadas.
Nos dias bons. Nos dias maus. Nos dias. Bate. Pelas nove.
Esta vontade de te sentir. E vens. Religiosamente. Com a tua voz. E o teu amor.
E o teu carinho. Cheia de tudo o que falta ao mundo. Fazes parar o relógio na
ternura da tua voz. Ficas próxima, por alguns minutos, na presença quente das
palavras. Abraças-me, assim, até aos ossos, até à alma, até ao coração. E ficas
dentro dele. Permanentemente. A tempo inteiro. Gosto de te ter lá.
É um amor que me bate no peito o dia todo. Concretizando-se,
todos os dias. Com um beijo antes de dormir. No bater das nove.
Marina Ferraz
*Imagem retirada da Internet
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