Encontramo-los. Um pouco por todo o lado. Ganchos de cabelo.
Palhetas. Más notícias. Parecem migalhas pelo chão da casa. Obrigando-nos a
fazer vénias desassossegadas a cada dois passos. Como se fossemos servos da
vida e não seus convidados.
Brilham no encontro do sol. Ou camuflam-se nas frestas da
madeira. Maquilham-se de novidade. E lá ficam. Dentro dos tubos das máquinas de
lavar. Dentro das ranhuras dos móveis. Encostados aos cantos do azulejo.
Perdidos no meio dos lençóis. Ganchos e palhetas. E más notícias. Perdidos por
todos os espaços plausíveis e implausíveis.
Os passos que nos separam do encontro com o inesperado
tornam-se eternidade. E podemos passar a vida de joelhos. A apanhar o metal dos
ganchos. O plástico das palhetas. A inquietude das más notícias. Se nos
deixarmos levar pela tendenciosa esperança de que não exista caos onde a ordem
nunca governou.
E avançamos. A casa é um mundo maior nos olhos que buscam o
equilíbrio. E torna-se difícil gerir o encontro caótico com objetos inusitados
pelo soalho. Agimos como se eles tivessem alma ou resposta pronta.
Intempestivamente gritando com eles. Ao mesmo tempo que nos curvamos, num gesto
mecânico e que pouco diz sobre as nossas crenças ou lealdades.
Ganchos, palhetas e más notícias. Podemos esperar
encontrá-los por aí. Espalhados no chão das nossas vidas. Perdidas e à espera
do encontro. Encontradas e à espera de se perderem. Objetos e sentidos com vida
própria. Que nunca sabemos onde estão e que estão em todo o lado. Fazendo-nos
revirar olhos. Olhos que se pousam no chão. E que os encontram, no vento que
nos sai dos lábios frustrados. Outra vez. Raios.
Desconfio que os ganchos de cabelo, as palhetas e as más
notícias não tenham culpa. A culpa reside nos olhos que, cansados do confronto,
se prendem no chão. O problema reside mais no curvar do pescoço do que no
curvar de costas. Talvez os olhos no chão sejam a vénia mais usual da
atualidade e a que mais dano causa a uma alma que nasceu para as vistas
panorâmicas do ser.
Confesso. Estou farta de os encontrar. Ganchos, palhetas e
más notícias. Talvez seja hora de largar o chão. Se não com os pés, ao menos
com os olhos. O horizonte fica em frente. E o pôr-do-sol também está lá todos
os dias. Não tem más notícias. Nem ganchos de cabelo. Nem palhetas. Tem raios e
tonalidades quentes. Tem a novidade repetitiva da noite que cai e anuncia o dia
que se segue. Ainda que o vejamos de rosto erguido, esse sim, merece que nos
curvemos na mais sentida das vénias.
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