Odeio os domingos. Não porque sou particularmente fã da segunda-feira, mas porque acho os domingos mais desonestos. Noto, na claridade das suas manhãs, o capricho acentuado de saber que é o filho favorito da semana. E torna-se arrogante. Nasceu com o cu virado para a lua. Não tem de fazer rigorosamente nada para ser amado... e é. Não por mim, entenda-se! Eu odeio o domingo.
Quando a semana começa, a esperança já foi. Sabe-se exatamente qual o espaço que vai do toque do despertador até ao retorno do corpo ao colchão. É assumidamente pesado, desde o primeiro instante.
O plano dos dias não deixa espaço para ilusões, exceto se considerarmos as almas que se agarram ao talão da máquina do quiosque, para confirmarem – à terça e à sexta-feira – que não ficaram milionárias. Mas as pessoas nem querem realmente ficar milionárias por nenhum motivo em particular. Não pretendem abrir ONG’s, nem patrocinar a construção de escolas e ATL’s ou distribuir comida nas zonas mais pobres da cidade, do país ou do mundo. A sua motivação é, usualmente, bastante simples: querem fingir que todos os dias são domingo. E, por isso, mesmo às terças e sextas, é o domingo que está a plantar ardis e a esvaziar as carteiras das pessoas.
Durante cinco dias. Conta-se. Segunda. Terça. Quarta. Quinta. Sexta. Mas só durante esses dias. Ninguém diz que o Domingo é Primeira... porque ele vem primeiro. Ninguém precisou de lho dizer. Ele sabia... Sabia e até fez questão de ser precedido de Sábado por isso mesmo: para que saibamos que ele sabe que será sempre o eterno favorito.
Só que, Deuses, olhemos a arrogância! O domingo faz de tudo para ser droga. Dá a si mesmo nome de programação fútil e oca com os seus “filmes de domingo à tarde”. Promove o futebol nacional. Leva as beatas à missa e dá aos preguiçosos - mesmo que ateus - a desculpa de que podem descansar porque é o dia "do Senhor". Entretanto, proíbe que se ligue para qualquer lugar pertinente – incluindo as Finanças, a Segurança Social e os serviços, exceto em caso de emergência. Faz com que gestantes de águas rebentadas levem uma injeção para atrasar o parto até horário mais conveniente, a menos que seja de todo impossível evitar que aquele ser ignóbil que decidiu nascer no final da semana escorregue por entre as pernas da mãe para o mundo. E garante-se que nascerá a chorar! Provavelmente por ser domingo.
Eu odeio os domingos. Entendo totalmente porque é que chamaram dias úteis aos outros dias da semana. O domingo é inútil. Tão inútil que precisa de outro dia inútil a precedê-lo, para abrir alas à sua inutilidade. Não serve para nada, senão para acentuar a preguiça e o ócio. Não serve para nada senão para nos iludir com a ideia do dia bom (que não é) e nos desiludir, a seguir. Não serve para nada senão para nos lembrar de que o dia que se segue é um voltar à rotina, esperando o domingo seguinte, pela crença desajustada de que “o próximo é que é!”.
Odeio os domingos. Não porque sou particularmente fã da segunda-feira, mas porque acho os domingos mais desonestos. Não tenho medo da honestidade. Por isso escrevo esta carta de desamor. Dizendo que o odeio. O domingo. E escrevo isto numa terça-feira. Porque se o escrevesse ao domingo, os correios estariam fechados...
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